Além do impeachment contra o presidente da República, manifestantes protestaram contra a privatização dos Correios e exigiram vacinas contra a Covid-19. Em SP, centenas de pessoas se reuniram no Theatro Municipal; PM do Rio prendeu dois manifestantes
Pela quarta vez em um período de pouco mais de dois meses, manifestantes se reuniram em diversos atos pelo Brasil nesta terça-feira (13/7) para aumentar a pressão pela saída do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Desta vez os protestos também defenderam os serviços públicos e os Correios.
Em São Paulo, centenas de pessoas se reuniram em frente ao Theatro Municipal e marcharam contra o governo até a praça da República no final desta tarde. No Rio de Janeiro um grupo de pessoas também se reuniu, mas foram surpreendidas por forte repressão da Polícia Militar, que agrediu e prendeu duas pessoas, segundo relatos de manifestantes obtidos pela Ponte.
De acordo com uma manifestante que preferiu não se identificar com medo de perseguição da polícia, o ato saia da Candelária por volta das 17h da tarde. Quando impedidos de seguir pela Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro, os manifestantes insistiram em ocupar as ruas e marchar até a Cinelândia, onde a repressão começou. “A gente saiu da Candelária, não iam deixar a gente fechar a rua, o pessoal do bloco autônomo fechou a rua depois de apanhar da polícia, quando fomos tocar para a Cinelândia o resto do ato acompanhou a gente, subimos na escada da Câmara de Vereadores e em algum momento a polícia subiu para bater mesmo uma manifestante foi arrastada pelo cabelo, rasgaram a roupa dela, ficou só de sutiã, vários cercaram ela. Quem não foi detido foi reprimido com bombas, balas de borracha e pela cavalaria”, conta a jovem.
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Samara de Oliveira Guerreiro e Denys Menezes foram detidos e levados para a 5ª DP, no centro do Rio, mas ambos já foram soltos. Um outro manifestante e repórter da Mídia1508 que preferiu não se identificar por medo de represálias reiterou o ocorrido. “Os dois foram muito agredidos pela PM, foi uma repressão brutal, teve manifestante atingido com bala de borracha. O menino está sendo acusado por dano ao patrimônio, a moça foi muito agredida”, alegou o repórter, que acompanha a ocorrência na delegacia. Um vídeo do mesmo canal mostra o momento em que uma mulher é detida sem a presença de uma policial feminina na saída da manifestação.
A jornada de protestos pelo país começou em 29 de maio, os dias 19 de junho e 3 de julho também foram marcados por manifestações e um novo ato está agendado para o dia 24 de julho. Com críticas à reforma administrativa prevista na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 32 e pedidos por auxílio emergencial no valor de R$ 600, os participantes do ato em São Paulo gritavam as palavras de ordem como “Vacina na veia, Bolsonaro na cadeia” e “Bolsonaro genocida”.
Desta vez o ato foi puxado por movimentos autônomos, organizações antifascistas, estudantes, sindicatos e pelo partido Unidade Popular (UP). De acordo com a presidenta da legenda, Vivian Mendes, 40 anos, o governo Bolsonaro é genocida e por isso é preciso que ele saia imediatamente. “É um governo genocida com práticas e genocidas, de graves violações de direitos humanos, que pratica crimes de lesa-humanidade. A situação do país é muito grave”.
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Mendes aponta que pesquisas como a publicada pelo Instituto Datafolha neste sábado (10/7) já mostraram que 54% da população se diz a favor da abertura do processo de impeachment de Bolsonaro, contra 42% que disseram ser contrários, e por isso, para ela, é preciso manter a pressão nas ruas.
“O ato de hoje ele traz para o centro do debate a reivindicação contra as privatizações, contra a reforma administrativa, contra os altíssimos preços da conta do gás, as políticas de desmonte da classe trabalhadora”, diz Vivian Mendes, uma das organizadoras do ato.
Atualmente, somam-se 125 pedidos pela destituição do presidente parados na Mesa Diretora do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL). “A expressão dessa indignação tem que estar nas ruas para que a gente vá, de fato, ter uma correlação de vantagem na sociedade, que permita que a gente consiga derrubar esse governo. Sem isso a gente não acredita que é possível, não podemos confiar na institucionalidade para derrubar o governo Bolsonaro, já vimos que não faltam crimes, não faltam provas, só falta a gente inviabilizar esse governo, e só vamos fazer isso com as ruas lotadas”, diz a ativista do UP.
A concentração do ato em SP começou por volta das 17h no centro da capital. A manifestação ocupou as ruas da Avenida São João, da Av. Ipiranga com a Av. São João, todas no centro da cidade e seguiu calma até a Praça da República.
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Guilherme Brasil, 25 anos, profissional autônomo e integrante do Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB) e também da Ocupação dos Imigrantes, lembra das acusações de corrupção que permeiam o governo atualmente. “Aumentou a corrupção no país e isso desde o início do governo vem se demonstrando, mas agora também com esses novos casos das corrupções, das vacinas.”
Para ele, a manifestação também contesta o cenário de desemprego e desesperança na população. “Você tem um número baixíssimo do valor do salário mínimo. Enquanto isso, o preço das coisas aumenta cada vez mais, tem um déficit habitacional muito maior e o número de despejos é muito grande também. Além da própria gestão da pandemia, em que mais de 500 mil pessoas já morreram no nosso país, sendo que as vacinas poderiam ter sido dadas muito antes.”
Guilherme ainda diz que é um absurdo se naturalizar as mortes na pandemia. “Não é possível que se naturalize uma quantidade de mortes desse tamanho. É por isso que a gente tem que estar na rua, para arrancar o Bolsonaro, mas para fortalecer a nossa classe e enfraquecer esse setor da burguesia que quer a qualquer custo colocar essa crise nas costas dos trabalhadores e aumentar a super exploração que já é muito grande. Por isso vamos continuar nas ruas e chegar até o limite para conseguir arrancar esse governo.”
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O uso de máscaras, álcool gel e o distanciamento social foram respeitados durante a maior parte do ato, conforme solicitado pelos organizadores da manifestação.
A estudante Kemi chamou a atenção para o Projeto de Lei 490 que dificulta a demarcação de terras indígenas e que avança na Câmara dos Deputados em Brasília. “A gente vem gritar não ao PL 490, que continua com o roubo das Terras Indígenas, para quem lutou mais de 500 anos até hoje não vale a pena esperar até 2022. A bancada ruralista que é inimiga do nosso povo, que mina os direitos indígenas duramente conquistados é a mesma inimiga dos quilombos e do povo do campo, nas cidades nas ocupações. A gente grita não ao PL 490.”
Danielly Oliveira, 23, representante da frente negra antirracista criticou duramente o governo. “Esse governo é podre e está apodrecendo a cada dia, mas vamos ser nós que vamos empurrar esse governo para a cova”, disse.
O ato teve pouca interferência da Polícia Militar, que isolou as ruas do centro, a manifestação seguiu pacífica na maior parte do tempo, policiais estavam com o efetivo maior, que estava preparado ao final da Praça da República e nos arredores do Theatro Municipal.
O protesto estava programado para terminar na Praça Roosevelt, no entanto segundo os organizadores a polícia não permitiu que a caminhada se desse até o local. Chegando na Praça da República, um manifestante chamado João Felipe da Silva foi abordado por policiais, que cercaram o homem encapuzado com escudos.
O tenente-coronel Cruvel da PM disse ter achado que havia encontrado um soco inglês com o manifestante, mas depois percebeu que o objeto não era a arma branca. O homem chegou a ser levado para uma viatura, mas logo foi solto. Na última manifestação contra o presidente Jair Bolsonaro, o tatuador Machado Xavier, 25 anos foi preso e acusado de ter agredido um dos seguranças do Metrô para furtar um capacete. Após 10 dias preso, o Tribunal de Justiça de São Paulo ordenou a soltura do jovem.
Com a interdição da PM em parte do local, os manifestantes deixaram a região rapidamente.
Outro lado
A Ponte procurou a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo para esclarecimentos sobre a detenção no ato e aguarda as respostas.
Em nota a assessoria de imprensa da Secretaria de Estado de Polícia Militar do Rio de Janeiro informou que os policiais militares do 5ºBPM (Praça da Harmonia) e do Batalhão de Polícia de Choque (BPChq) acompanharam a manifestação no Centro da cidade do Rio de Janeiro e que houve um “início de tumulto por parte dos manifestantes, sendo necessário o uso de armamento não letal para estabilizar o ato que, até então, ocorria de modo pacífico. Dois indivíduos foram encaminhados para a 5ª DP por pichar a Câmara Municipal”.