Entidades cobram do Ministério Público protocolo para redução de mortes pela PM em SP

    Demanda é uma resposta a casos frequentes de violência e aumento da letalidade policial no governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos) e seu secretário da segurança pública, Guilherme Derrite

    Protesto em Santos no domingo (8/12) marcou um mês da morte de Ryan da Silva Andrade, de 4 anos, baleado durante uma operação policial | Foto: Luana de Oliveira/Rede de Proteção e Resistência Contra o Genocídio

    A Ouvidoria das Polícias e um coletivo de organizações e movimentos sociais cobram do Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP) um plano de redução da letalidade policial. A demanda é uma resposta ao aumento da violência da letalidade policial no governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos) e seu secretário Guilherme Derrite. O pedido tem como pano de fundo a morte de uma criança em Santos e os recentes casos de violência policial divulgados pela imprensa. O documento foi entregue na última sexta-feira (6/12) ao procurador-geral de Justiça, Paulo Sérgio de Oliveira e Costa.

    “É bom que a gente fale que o Ministério Público tem a função de fazer o controle da atividade policial. E se ele se torna omisso, nós vemos o cenário que temos hoje”, diz Carolina Diniz, coordenadora de enfrentamento à violência institucional da ONG Conectas Direitos Humanos, uma das responsáveis pelo relatório.

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    Em dois anos de governo, Tarcísio e Derrite promoveram duas operações sangrentas na Baixada Santista. A primeira delas, a Operação Escudo, resultou em 28 mortes em 40 dias. A ação policial ocorreu após a morte de Patrick Bastos Reis, de 30 anos, soldado da Rota (Rondas Ostensivas Tobias Aguiar), morto em serviço no Guarujá, litoral paulista, em julho do ano passado.

    Leia relatório na íntegra

    Em janeiro, mesmo após denúncias de violações da operação anterior, Tarcísio e Derrite levaram o terror novamente à região, com a chamada Operação Verão. Mais uma vez, a ação ocorreu em resposta à morte de um policial. Samuel Wesley Cosmo, 35, levou um tiro no rosto enquanto atendia uma ocorrência em Santos. Ao todo, 56 pessoas foram mortas. Entre as vítimas estão a dona de casa Edneia Fernandes Silva, 32, mãe de seis filhos, o catador de latinhas José Marques Nunes da Silva, 45, que implorou para não morrer e o jovem com deficiência visual Hildebrando Simão Neto, 24. 

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    O grupo pede que seja feito o reconhecimento das violações de direitos humanos durante a operação e exige o fim das ações no Morro São Bento, região onde Ryan da Silva Andrade Santos, 4, foi morto durante uma investida policial.

    Entidades e o ouvidor das Polícias, Claudio Aparecido Silva, entregam o documento ao procurador-geral de Justiça, Paulo Sérgio de Oliveira e Costa, na sexta-feira (6/12) | Foto: Melissa Carla/Ouvidoria

    Protocolo de abordagem e perícia independente

    As entidades também cobram um pedido público de desculpas, reparação integral às vítimas e a garantia do direito ao luto sem a interferência de agentes do Estado. A cobrança se estende à Secretaria da Segurança Pública (SSP-SP). O grupo quer que o MP cobre da SSP o protocolo de abordagem e operação policial em localidades com alta concentração de crianças e adolescentes, como quadras, escolas, creches, hospitais ou postos de saúde. 

    “Cabe ao Ministério Público o controle externo da atividade policial. Ele tem que fazer um controle, uma atuação no caso concreto, mas também uma ação de tutela coletiva”, sustenta Carolina.

    A coordenadora defende que o MP deve agir promovendo a responsabilização, mas também na construção de políticas públicas para a redução da letalidade, da violência e da corrupção policial.

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    Concretamente, a cobrança é para o MP assumir a investigação de casos envolvendo violência policial e que a perícia também seja independente. “O Ministério Público, que tem essa atribuição, poderia designar técnicos para produzir perícias independentes, porque hoje a perícia é vinculada à Secretaria de Segurança Pública de São Paulo e é vinculada, portanto, também às forças policiais”, completa Carolina.

    O relatório é resultado da visita de um coletivo formado por movimentos sociais e liderado pela Ouvidoria das Polícias feita a Santos, no dia 7 de novembro. O grupo esteve no litoral paulista após a execução de Ryan e de Gregory Ribeiro Vasconcellos, 17, durante uma ação policial. Além dos dois mortos, um adolescente de 15 e uma jovem de 24 também ficaram feridos na abordagem.

    A região onde Ryan e Gregory foram mortos tem sido alvo de operações policiais com alto índice de letalidade — como as operações Verão e Escudo. Leonel Andrade Santos, 36, pai de Ryan, foi morto justamente durante a Operação Verão, em fevereiro deste ano. À Ponte, familiares contaram que Leonel conversava na rua com o amigo de infância Jefferson Ramos Miranda, 37, quando a dupla foi alvo de disparos de policiais do 4º Batalhão de Choque.

    Faixa homenageia o menino Ryan, de 4 anos, na escola em que ele estudava no morro São Bento, em Santos | Foto: Luana de Oliveira/Rede de Proteção e Resistência Contra o Genocídio

    Não foi ‘bala perdida’

    A missão ouviu familiares e testemunhas da ação que resultou na morte de Ryan e Gregory. Segundo o relato, dois policiais fardados chegaram ao local em um carro branco descaracterizado. Os agentes teriam esperado os adolescentes passarem de moto pela rua e, então, iniciado os disparos. Gregory foi morto com 11 tiros. As testemunhas contaram que a dupla não estava armada e foi atingida pelas costas.

    Após alvejarem os adolescentes, ainda conforme os relatos, policiais seguiram atirando para cima e para os lados. Ryan, que brincava na rua com outras crianças, foi atingido no abdômen. Para as testemunhas, não é possível falar em “bala perdida” já que a criança não estava na mesma direção dos adolescentes.

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    Em entrevista coletiva após o caso, o porta-voz da Polícia Militar, Emerson Massera, assumiu que o tiro que matou Ryan “provavelmente foi disparado pela Polícia Militar”. 

    O texto destaca ainda que, no dia do velório de Ryan, policiais militares acompanharam a pé, em motos e viaturas, o cortejo e o sepultamento da criança. Os agentes, que pertenciam ao 2º Batalhão de Ações Especiais de Polícia (BAEP) e à Tropa de Choque, ostentavam armas de grosso calibre.

    Em frente ao cemitério, uma viatura do 21º Batalhão de Polícia Militar do Interior (BPM/I) estacionou sob justificativa de patrulhamento. O ouvidor das polícias, Claudio Aparecido Silva, chegou a discutir com os agentes após relato de que um motociclista teria sido agredido com um tapa na cabeça por um PM. O ouvidor pediu respeito ao momento de dor da família de Ryan. A Ponte flagrou que um dos PMs, identificado como sargento Ailton, estava com a câmera corporal no bolso do colete. O uso correto do equipamento é acoplado à farda.

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    O relatório destaca ainda que, durante o velório de Ryan, a jovem que levou um tiro de raspão teve a casa invadida e vasculhada por policiais militares. O cunhado dela teria sido agredido durante a ação. 

    No domingo (8/12), manifestantes fizeram um ato em Santos para marcar um mês da morte de Ryan. A mãe da criança, Beatriz da Silva Rosa, de 29 anos, participou do protesto. O grupo percorreu o morro São Bento, onde a família do menino mora, e exibiu faixas pedindo por justiça. Não houve presença policial durante a manifestação.

    O que dizem as autoridades 

    A Ponte pediu uma manifestação do MP-SP sobre a cobrança das entidades. Em nota, o MP informou que o PGJ teve a oportunidade de explicar a representantes de diversas entidades de que maneira exerce o controle externo da atividade policial.

    “O relatório sobre episódios de intervenção da Polícia Militar na Baixada Santista que as entidades entregaram ao procurador-geral de Justiça, Paulo Sérgio de Oliveira e Costa, trará subsídios à atuação da instituição neste campo”, diz o texto.

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