Delegado ignora detenção ilegal de adolescente e autua mãe que reclamou

    PMs de Guariba (SP) apreenderam quatro adolescentes sem motivo e ameaçaram “esfolar” e “enfiar ferro no cu”, segundo a mãe de dois deles

    Além de apreender ilegalmente quatro adolescentes na cidade de Guariba, no interior de São Paulo, na terça-feira (21/7), PMs agrediram e ameaçaram os garotos. “Se eu te pegar na rua de noite vou te esfolar o rosto inteiro”, teria dito um dos policiais, segundo a cabeleireira Carina da Silva dias, 39 anos, mãe de dois dos garotos.

    No final de tudo, sobrou para ela: os policiais prestaram queixa contra Carina por calúnia porque, durante a ação, na tentativa de proteger os filhos de 17 e 14 anos, ela gritou “parem de bater”. O delegado Reginaldo Felix foi o responsável pela autuação.

    A mulher estava em casa com o filho mais novo, de 8 anos, e duas sobrinhas. Quando o garoto foi ao portão, viu um dos policiais dando um tapa no rosto do irmão mais velho, de 17. Os policiais argumentam terem feito a abordagem em busca de drogas, mas não encontraram nada com os rapazes.

    Leia também: PM agride pai e mãe de jovem que fugiu de abordagem, segundo família

    “Na hora, ele voltou correndo me contando e dizendo para eu não ir lá. Peguei o celular, saí filmando e fui”, lembra Carina. Ela viu os dois filhos sentados na calçada, em cima das suas mãos, enquanto os policiais perguntavam sobre droga. “Onde está?”, cobravam.

    Os PMs que realizaram a abordagem são Reginaldo Dias da Silva, Marcos Antônio Cabral Galo e Lucas Rodrigo Junqueira Moraes e integram o 43º Batalhão da PM, com base em Sertãozinho, cidade vizinha a Guariba. Estavam na viatura com identificação I-43219.

    “Eu cheguei querendo saber o que estava acontecendo, que era para parar de bater. E o policial mandou eu parar de filmar”, continua a cabeleireira. Vídeo obtido pela Ponte mostra a ação e o PM dizendo que os adolescentes seriam levados “para averiguação”.

    Durante a ação, ela conta que o filho mais velho a chamou e relatou uma ameaça dos PMs. “Mãe, ele disse que se a senhora não parar de filmar, ele me enquadra por tráfico”, teria dito o rapaz. Ao mesmo tempo, um dos PMs, Reginaldo Dias da Silva, apreendeu o celular que ela usava para gravar a ação.

    Leia também: Depois de atirar em pai e filho, PM culpa uma das vítimas por depredar moto da corporação

    O jovem de 17 anos tinha R$ 90 no bolso, segundo a mulher, dinheiro dado pelo pai para ele comprar uma bermuda. O policial rasgou as notas, conforme denunciam. A mãe pediu que o outro filho, de 8 anos, filmasse o restante da ação com outro celular após o dela ter sido pego pelo PM.

    Dinheiro que teria sido rasgado por um dos PMs | Foto: Arquivo/Ponte

    Carina conta que os quatro adolescentes foram colocados na viatura e ela foi levada à delegacia de Guariba. Ainda de acordo com a cabeleireira, os PMs levaram os adolescentes para a Santa Casa para fazer exame de corpo de delito e depois teriam ficado rodando com eles na viatura pela cidade.

    “Os ameaçaram. Disseram que eu era brava, mas que os pegariam longe de mim. Que se visse meu filho mais velho na rua de noite ia esfolar a cara dele. Para o outro, ameaçou colocar um ferro no cu dele”, denuncia a mulher.

    Enquanto isso, ela acabou enquadrada por crime de calúnia com base no depoimento dado pelos PMs ao delegado Reginaldo Felix. A argumentação é que ela mentiu ao gritar “estão batendo, parem de bater, parem de bater” quando chegou perto dos filhos.

    O registro da ocorrência destaca que, “tendo em vista a calúnia cometida pela senhora, já que durante a abordagem nenhum dos indivíduos foi agredido”, um dos PMs apreendeu o celular da mulher “para que fosse utilizado como prova”.

    Construa a Ponte!

    O policial Reginaldo Dias da Silva, que pegou o celular da mulher, aparece como “vítima” no documento, enquanto seu parceiro, o PM Marcos Antônio Cabral Galo, é posto como testemunha da calúnia.

    A Ponte questionou a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo, comandada pelo general João Camilo Pires de Campos neste governo de João Doria (PSDB), sobre a ação em Guariba e aguarda um posicionamento. A reportagem também solicitou entrevista com os policiais citados e com o delegado Reginaldo Felix e, até o momento, não obteve retorno.

    Já que Tamo junto até aqui…

    Que tal entrar de vez para o time da Ponte? Você sabe que o nosso trabalho incomoda muita gente. Não por acaso, somos vítimas constantes de ataques, que já até colocaram o nosso site fora do ar. Justamente por isso nunca fez tanto sentido pedir ajuda para quem tá junto, pra quem defende a Ponte e a luta por justiça: você.

    Com o Tamo Junto, você ajuda a manter a Ponte de pé com uma contribuição mensal ou anual. Também passa a participar ativamente do dia a dia do jornal, com acesso aos bastidores da nossa redação e matérias como a que você acabou de ler. Acesse: ponte.colabore.com/tamojunto.

    Todo jornalismo tem um lado. Ajude quem está do seu.

    Ajude

    mais lidas