Artigo | Caso Pedro Henrique: MP precisa dizer à sociedade que não quer assassinos impunes

Ativista foi morto em 27 de dezembro de 2018 em Tucano, na Bahia, aos 31 anos. Policiais suspeitos da morte foram indiciados em 2019, mas Ministério Público da Bahia ainda não ofereceu denúncia e eles trabalham normalmente

A professora e escrivã da Polícia Civil da Bahia Ana Maria Cruz com o filho e ativista Pedro Henrique Santos Cruz Sousa, assassinado a tiros em casa em dezembro de 2018 | Foto: arquivo pessoal

“Um soldado da Paz”, assim Pedro Henrique Cruz foi definido pela letra de uma música feita em sua homenagem. Ele foi assassinado na cidade de Tucano (BA), em 27 de dezembro de 2018, quando tinha apenas 31 anos.

Os autores foram três homens encapuzados que invadiram sua casa na madrugada e o executaram enquanto dormia, com 8 tiros na cabeça e no pescoço. Pelo menos uma testemunha reconheceu os três homens como sendo policiais da região.

Pedro Henrique era um defensor de direitos humano que, para familiares e amigos, perdeu a vida em represália a seu ativismo contra a violência policial. Ele era idealizador da “Caminhada da Paz”, em Tucano, evento solidário que consistia na arrecadação de alimentos para pessoas em vulnerabilidade social e no questionamento à forma com a juventude negra da cidade vinha sendo tratada por agentes de segurança pública. Mesmo com a enorme perda, a mãe do ativista, Ana Maria Santos Cruz, continuou promovendo as caminhadas, inclusive a que acontecerá no próximo dia 14 de março, às 14h, no Alto do Cruzeiro, em Tucano.

Os policiais suspeitos de matarem Pedro Henrique foram indiciados em 2019. Mas quase 6 anos depois, eles trabalham normalmente e não foram levados a julgamento. Na verdade, sequer a denúncia foi oferecida ao Tribunal de Justiça pelo Ministério Público do Estado da Bahia (MP-BA), órgão chegou a receber relatos formais de Pedro, em vida, a respeito de agressões, intimidações e ameaças que vinha sofrendo por parte de PMs na cidade. Nada foi feito e o desfecho foi o que conhecemos.

Está, portanto, nas mãos do MP-BA, ao menos oferecer denúncia e, com isto, dizer à sociedade, aos amigos e familiares de Pedro que haverá, sim, justiça e que não se pode tolerar que assassinos de quem defende os direitos de todos escapem impunes. A Anistia Internacional Brasil está na Bahia, ao lado, da mãe de Pedro, Ana Maria, para cobrar. Por isso, temos um encontro marcado com o procurador-geral de
Justiça Pedro Maia Souza Marques no qual faremos a entrega simbólica de mais de 500 mil assinaturas, colhidas em 51 países, pela campanha global “Escreva por Direitos”, que tem como um de seus casos o apelo por justiça que a mãe do ativista tem feito desde seu assassinato.

A possibilidade real de arquivamento do caso por qualquer alegação após quase 6 anos de impunidade é um resultado inadmissível para nós da Anistia Internacional Brasil e para os milhares de cidadãos brasileiros e estrangeiros que têm se engajado na campanha por justiça por Pedro Henrique.

Nunca é demais lembrar que o MP-BA não tem apresentado respostas consistentes diante de crimes cometidos por policiais militares. Informações obtidas por nós via Lei de Acesso à Informação (LAI), apontam que entre julho de 2021 e outubro de 2023, apenas 17 procedimentos relativos a mortes por intervenção policial acompanhados pelo Grupo de Atuação Especial Operacional de Segurança Pública (Geosp), o grupo de controle externo da atividade policial do Ministério Público do estado da Bahia,
resultaram em denúncia.

Os procedimentos se referem a 22 vítimas, todas do sexo masculino e negras. Contudo, apenas em 2023, 1.701 pessoas foram mortas por intervenção policial na Bahia. Mesmo assim, num período de dois anos, o número de denúncias oferecidas pelo MP-BA corresponde a menos de 2% do número de vítimas letais da violência policial no último ano no estado.

Ajude a Ponte!

Queremos que o caso de Pedro Henrique Cruz represente o início da ruptura do sistema de justiça com uma cultura de impunidade ante a violência letal praticada por agentes públicos, tanto contra jovens negros quanto contra defensores de direitos humanos no estado da Bahia.

*Jurema Werneck é médica, doutora em comunicação e cultura pela Escola de
Comunicação da UFRJ. É membro dos Conselhos de Criola, Instituto Marielle Franco e
diretora executiva da Anistia Internacional Brasil.

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