Moradores da Favela do Moinho, em São Paulo, afirmam que ações se intensificaram na pandemia e que mesma equipe de policiais promove rotina de agressões e ameaças
Uma operação da Polícia Militar na favela do Moinho, no centro da cidade de SP, terminou em repressão na manhã desta quarta-feira (29/4), quando a comunidade reagiu ao que uma moradora, que pediu para não ser identificada, chamou de regime “de agressão todo dia”.
Revoltados com a prisão de Bruno Carvalho, 24 anos, Adriano Silvestre, 25, e Fabrício Gomes, 26, moradores da comunidade fecharam a avenida Rio Branco e foram recebidos com bombas de gás lacrimogêneo, efeito moral e spray de pimenta.
Segundo testemunhas que conversam com a reportagem da Ponte, a reação começou após um rapaz ser arrastado “bastante ferido” pelas ruas do Moinho. Moradores relatam que no último mês, durante a pandemia, as incursões da Polícia Militar na comunidade têm se intensificado e acontecem “quase todo dia”. De acordo com relatos, a PM tem entrado nas casas sem mandado, destruído móveis e ameaçado moradores que tentam registrar as ações.
A PM entrou na comunidade por volta das 9h, o conflito teve início às 12h e durou cerca de 40 minutos. Os moradores responderam à ação das tropas de Choque da Polícia Militar e da Guarda Civil com pedradas e pedaços de pau. Testemunhas da comunidade afirmam que, de cima do viaduto que atravessa a comunidade, bombas foram lançadas dentro da casa de moradores, atingindo idosos e crianças.
“Eles levaram o rapaz algemado e estavam em sete agredindo ele, a gente foi ver e se revoltou. Porque se eles vieram para prender, era pra levar pra delegacia, não torturar. A gente não tá em guerra. A gente pisa em barro, mas é gente”, disse um catador de recicláveis, que, por medo, não quis se identificar e acabou surpreendido quando, segundo ele, recebeu um soco de um policial.
“Eu não recebo auxílio, só violência. Se eu não me arriscar, passo fome. Aí chega um fardado e abusa da autoridade para bater em pai de família e jogar gás em grávida? Tudo porque a gente se manifestou pacificamente fechando a rua?”, protesta o rapaz, ao destacar os problemas econômicos decorrentes da pandemia.
Uma outra moradora, que também trabalha como carroceira, disse que o assédio da Polícia Militar se intensificou e que a porta da casa dela está “destruída” de tantas vezes que foi invadida. Ela tem duas filhas pequenas e disse que se assustou com a truculência da ação. “Parecia que só ia parar quando matasse um, como foi com aquele rapaz, o Leandro [Souza Santos, morto em operação em junho de 2017]”, disse.
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A Ponte questionou se o ouvidor das Polícias de SP, Elizeu Soares Lopes, tomaria alguma atitude referente à ação na comunidade. Segundo ele, o órgão abriu procedimento para ouvir os moradores da Favela do Moinho. No entanto, ele não foi à favela nem à delegacia, como costumeiramente seus antecessores faziam em casos de repercussão. “Não entendi porque teria que ir até lá”, respondeu.
O que diz a polícia e o governo
A Ponte questionou a Polícia Militar durante a ação, mas não obteve resposta. Às 15h30, reportagem foi ao 77º DP (Santa Cecília), para saber informações sobre os detidos e sobre os motivos da ação. Dois policiais militares se recusaram a conversar com a reportagem e disseram que não falariam “com defensor de traficante”.
Um deles era o sargento Roberto Alexandre Ferreira da Silva, que, segundo informações dos moradores, tem liderado as incursões na comunidade. Ele integra o 7º Baep (Batalhões de Ações Especiais), conhecida por ter um padrão “Rota” (a tropa mais letal da PM paulista) de atuação e que foi expandido na gestão de João Doria (PSDB). Essa unidade do Baep, especificamente, foi inaugurada pelo atual governador.
Em 24 de março deste ano, a Ponte publicou um relato da advogada Juliana Hashimoto. Na ocasião, ela foi insultada pelo sargento ao acompanhar uma abordagem de pessoas em situação de rua na região central de São Paulo.
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A reportagem questionou a PM e a SSP-SP (Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo), por e-mail, sobre o comportamento do sargento Ferreira Silva e as entradas, supostamente por ele comandadas, na favela do Moinho, mas não obteve retorno.
Até às 17h30, os três detidos ainda não tinham tido o registro do boletim de ocorrência sobre a prisão feito na delegacia. Familiares que esperavam à porta do DP conversaram com a reportagem chegaram a manifestar preocupação pela falta de informação sobre os rapazes.
“Meu irmão [o Adriano] tinha ido buscar uma cesta básica quando foi detido. Eu fui até lá e disseram que era para averiguação e colocaram ele dentro do carro e até agora a gente não sabe o que aconteceu”, disse Andreza Silvestre, moradora da comunidade.
Por volta das 19h, Andreza confirmou que ele e Fabrício foram indiciados por tráfico de entorpecentes e serão levados ao Centro de Detenção Provisória (CDP) de Pinheiros. Ela afirmou que testemunhou a revista do irmão e disse que, no momento em que ele foi detido, não foi encontrada nenhuma substância.
Em nota, a SSP-SP disse que os policiais do 7º Baep prenderam três indivíduos por tráfico de drogas e foram localizadas “porções de cocaína, crack, maconha e lança perfume, além de R$ 32 mil em dinheiro”.
“Após a saída das equipes do local, moradores da comunidade interditaram a Avenida Rio Branco e hostilizaram os policiais em protesto contra a prisão dos suspeitos. Arremessaram garrafas e pedaços de madeira, sendo necessária a utilização de técnicas de controle de multidões para desobstruir a via. Até o momento, não há relatos de feridos”, disse o órgão.
Reportagem atualizada às 19h03 do dia 29/4 para inclusão da informação de que os jovens foram indiciados e presos no Centro de Detenção Provisória de Pinheiros
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