Grupo quer ter atuação direta na Ouvidoria da Polícia para acompanhar investigação de PM que mata

    Proposta de Câmara Técnica para atuar junto ao ouvidor inclui representantes de movimentos sociais, pesquisadores e familiares de vítimas de SP

    Manifestantes protestam contra o massacre em Paraisópolis, ação policial com 9 mortos | Foto: Daniel Arroyo/Ponte Jornalismo

    Mais movimentos sociais se mobilizam para combater a letalidade policial em crescimento no estado de São Paulo. Depois de um grupo cobrar reunião com o governador João Doria (PSDB), agora uma nova iniciativa pretende colocar a sociedade civil como protagonista no controle das polícias.

    A ideia é criar um grupo dentro da Ouvidoria da Polícia do estado, que recebe denúncias de violações cometidas por policiais, para acompanhar o andamento dos casos. O nome sugerido é Câmara Técnica. Seriam priorizadas, em um primeiro momento, mortes de civis por policiais. Também estariam inclusos homicídios ou suicídios de policiais.

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    Policiais mataram 435 pessoas somente nos seis primeiros meses de 2020. Entre janeiro e junho, as ações policiais vitimaram 20% mais pessoas quando comparado com o mesmo período de 2019, quando 358 mortes foram registradas pela Secretaria da Segurança Pública de São Paulo. É o maior número desde 1996, com o início da contagem oficial.

    O Condepe (Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana) faz o diálogo entre as entidades e a Ouvidoria e pretende apresentar, ainda nesta semana, a proposta ao ouvidor, Elizeu Soares Lopes.

    De acordo com o texto, a intenção é que haja uma Câmara Técnica dentro da Ouvidoria com integrantes do Condepe, do Ministério Público, das polícias Civil e Militar, do Tribunal de Justiça, da Defensoria Pública, da Assembleia Legislativa de São Paulo, especialistas em segurança pública e movimentos sociais com coletivos e familiares de vítimas.

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    Participam da elaboração em torno de 20 coletivos, entre eles o Movimento Independente Mães de Maio, a Rede de Proteção e Resistência Contra o Genocídio, o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a ONG Conectas, A Ordem dos Advogados do Brasil em São Paulo, entre outros.

    Marisa Fefferman, integrante da Rede de Proteção, detalha que o objetivo é colocar uma equipe técnica para auxiliar o trabalho da Ouvidoria. Cita como exemplo uma norma da lei anticrime que travou investigações de mortes causadas por policiais em São Paulo.

    “Sentimos a importância da Ouvidoria, a sociedade está se propondo a trabalhar, a contribuir, já que temos 300 casos envolvendo mortes que estão parados”, afirma a representante da Rede. “A mensagem é: a sociedade cansou, não dá para matar mais. E a gente quer ajudar”.

    Segundo Dimitri Sales, presidente do Condepe, a ideia da Câmara Técnica surgiu em reuniões do Conselho com a sociedade. “Havia também o pedido de que exista um plantão 24h para elaboração de denúncias na Ouvidoria e criação de um conselho consultivo dentro do órgão”, explica.

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    “Importante destacar que não é uma Câmara que vai cuidar da Ouvidoria, é para acompanhar no âmbito do sistema de Justiça, das Corregedorias a tramitação dos casos de violação de direitos humanos”, explica, citando que não quer a “burocracia ou a força do corporativismo” façam com que os processos se percam.

    A falta de andamento é um dos pontos levantados por Gabriel Sampaio, coordenador do programa de Enfrentamento à Violência Institucional da Conectas. O especialista considera a proposta uma forma de a sociedade combater a ineficiência do Estado em relação à violência policial.

    “Diante da incapacidade, é fundamental organizar sociedade e especialistas para formular ideias que enfrentem esses problemas”, analisa.

    Sampaio afirma que o ouvidor Elizeu Soares Lopes se mostrou aberto à ideia e já deu declarações favoráveis à criação. “Só terá resistência se o poder público não tiver nenhum compromisso com a construção de políticas públicas que enfrentem a letalidade”, diz.

    Em entrevistas recentes, Lopes deu sinalização positiva para a criação de câmaras técnicas para enfrentar a violência policial e outras questões ligadas à Ouvidoria. Segundo ele, o momento demanda tal abertura.

    “Existe hoje um debate no mundo e, no Brasil, em particular, sobre a atividade policial e precisamos pensar um pouco o que está circundando essa prática”, afirma, em entrevista à Agência Brasil. A Ponte entrou em contato com a assessoria de imprensa da Ouvidoria e recebeu como resposta que Elizeu daria novas declarações somente quando a proposta de criação das câmaras estiver avançada, o que deve acontecer até o final desta semana.

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    “Queremos abrir uma câmara temática para discutir isso com a sociedade e os órgão de segurança pública do estado de São Paulo”, define, sobre o funcionamento do grupo, sem deixar de lado o racismo institucional existente na atuação da polícia. “Precisamos ressignificar a sociedade brasileira quanto à figura das pessoas pobres, em particular, da população negra”.

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