Jovem morto pela PM em roubo em Botucatu (SP) não fazia parte de quadrilha, garante família

    Familiar de Ivan de Almeida, 29 anos, rebate versão da PM que liga jovem a grupo criminoso autor de roubo: “Escolheu o caminho das drogas, não era bandido”

    Ivan era dependente químico e vivia nas ruas | Foto: Reprodução/Facebook

    Um grupo de 30 homens atacou bancos e gerou pânico na cidade de Botucatu, no interior de São Paulo, na madrugada de quinta-feira (30/7). A PM afirma que um homem supostamente ligado ao grupo foi morto em troca de tiros, mas familiares da vítima garantem que Ivan de Almeida, 29 anos, nada tinha a ver com o ataque.

    A versão oficial aponta que ele estava em um dos carros blindados usados pelos assaltantes e teria trocado tiros com os policiais, morrendo embaixo de um viaduto.

    Sob a condição de anonimato, uma familiar disse à reportagem que se revoltou ao ver o nome do irmão ligado ao ataque. Ela contou que ele era dependente químico e que há um mês morava embaixo de um viaduto da rodovia Marechal Rondon, mesmo tendo contato e convívio com os pais. “O Ivan escolheu o caminho das drogas, não era bandido”, resume.

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    No início daquela madrugada, quando o ataque já estava acontecendo, Ivan foi até a casa dos pais para contar sobre a movimentação e o barulho de tiros. “Alertou seu pai que tinha muito tiro na cidade. Ele, muito bobo, disse que ia lá para o cafofo dele. E ficou lá”, conta.

    Ivan tinha 29 anos e morava embaixo de um viaduto | Foto: Reprodução/Facebook

    O homem trabalhava como pedreiro. Dependente químico, acabou cedendo para o vício e passou a morar na rua. A parente afirma que nem dinheiro para a droga ele tinha mais, ganhava um troco cantando e pedindo para as pessoas. Antes, ele havia cumprido pena por furto, segundo a familiar, mas não conseguia oportunidade de emprego desde que saiu do sistema prisional.

    Os pais, um motorista e ônibus de 60 anos e uma auxiliar de cozinha de 55, souberam da notícia através da imprensa, quando os jornais locais informaram sobre a morte de um dos 30 integrantes do bando. “Nós identificamos ele através de fotos que vazaram de dentro da sala de emergência”, critica a mulher. Os pais estão medicados com calmante por conta do choque.

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    As imagens a que se referem mostram Ivan deitado, com marcas de tiro na cabeça e na perna. “Ele tomou um tiro de fuzil na perna e um na cabeça. Se estava baleado na perna, por que mataram ele? Estava no chão! Se deram o tiro na cabeça primeiro, por que depois teve na perna se ele já tava morto?”, questionou.

    A familiar de Ivan ainda explicou que ele não sabia dirigir, sendo que a versão da PM o coloca como o motorista do veículo então usado pelo bando. O homem estaria usando um colete a prova de balas na troca de tiros com os policiais.

    Antes de ceder à dependência, Ivan era pedreiro | Foto: Arquivo/Ponte

    Ela criticou o trabalho policial. “Nenhum bandido foi preso, nenhum bandido baleado e devem estar bebendo cerveja comendo churrasco comemorando a vitória deles, enquanto nós o enterramos. Restou saudade e um monte de comentário maldoso mentiroso”, lamentou. Ivan foi enterrado na manhã desta sexta-feira (31/7) em Botucatu.

    A vítima tinha um sonho: virar músico e ser conhecido como MC Sapequinha. Ele via nas ruas uma chance para isso acontecer. Nas redes sociais, moradores de Botucatu lamentaram o assassinato de Ivan.

    Um skatista relembrou o dia em que o conheceu: Ivan pediu uma blusa pelo frio que fazia e uma foto para lembrarem dele quando ele fizesse sucesso. “Descanse em paz e faça o sucesso que você tanto queria de onde estiver”, publicou o homem.

    As publicações geraram comoção. “Sei que Ivan está nos braços de Deus, ele era inocente. Tudo será mostrado no tempo de Deus. Sinto muito”, comentou uma moradora da cidade. “Gente como que essas fotos vazaram desse jeito? É uma falta de respeito com a família”, comentou outra, sobre as imagens de Ivan no Instituto Médico Legal.

    Como foi o ataque

    Uma quadrilha de aproximadamente 30 pessoas usou carros blindados, fuzis e fez moradores reféns ao atacar agências bancárias em Botucatu, cidade no interior de São Paulo, a 235 quilômetros da capital paulista, no fim da noite de quarta-feira (29/7) e início de madrugada desta quinta (30/7). O ataque repete o modus operandi de crimes cometidos em outras cidades de porte semelhante, como Ourinhos, em maio.

    Vídeos mostram a ação do grupo com a movimentação dos veículos pela cidade. Moradores registraram focos de incêndio propositais para atrapalhar a resposta da polícia, bem como imagens dos reféns rendidos pelos assaltantes. Um fuzil apreendido com o grupo possui o desenho de yin-yang, símbolo vinculado ao PCC (Primeiro Comando da Capital), e a inscrição 1533, números que representam as letras da facção – 15 para ‘P’ e 3 para ‘C’. A ação teria durado cerca de três horas.

    Segundo o Ministério Público Estadual de São Paulo, existe a probabilidade de a facção paulista estar envolvida no ataque. No entanto, integrantes do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) apontam não terem informações suficientes para cravar a ligação do PCC ao ataque neste momento.

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    Uma parte dos criminosos tentou fugir da cidade pela rodovia Marechal Rondon, tendo sido encontrados por viaturas da Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar), a mais letal da PM paulista.

    Um dos homens envolvidos no roubo foi preso após suposta troca de tiros. No carro que ele dirigia, um modelo Ford Ecosport, havia parte do dinheiro roubado e armas, segundo a polícia.

    Outro lado

    A Ponte questionou a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo, comandada pelo general João Camilo Pires de Campos neste governo de João Doria (PSDB), sobre a morte de Ivan e aguarda um posicionamento.

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