Ministério Público e juíza entenderam que cabo Jorge Baptista não auxiliou colegas por estar conduzindo viatura; Felipe da Silva e Vinícius Procópio foram mortos dentro de carro após abordagem policial em junho, na zona sul de SP
O Tribunal de Justiça de São Paulo determinou a soltura do cabo Jorge Baptista Silva Filho, 43, um dos três PMs acusados pelas mortes dos jovens negros Felipe Barbosa da Silva, 23, e Vinícius Alves Procópio, 19, em junho deste ano. Os dois foram baleados dentro de um carro com 30 tiros pelo sargento André Chaves da Silva, 46, e pelo soldado Danilton Silveira da Silva, 28, ambos da Força Tática do 1º Batalhão de Polícia Militar Metropolitano, no cruzamento das ruas Doutor Rubens Gomes Bueno e Castro Verde, em Santo Amaro, na zona sul da capital paulista.
A juíza Leticia de Assis Bruning acolheu o pedido da defesa de Jorge, que também teve manifestação favorável do Ministério Público, durante uma audiência que aconteceu em 8 de setembro. O cabo Jorge era quem conduzia a viatura e foi preso dias depois dos colegas. Justamente pelo fato de ser o motorista e não ter desembarcado do veículo, a magistrada entendeu que foram “enfraquecidos” os indícios de participação dele no crime.
“Afirmou ele [o cabo] em Juízo ter observado o procedimento operacional padrão da polícia militar no momento em que os corréus desembarcaram da viatura para abordagem do veículo ocupado pelas vítimas. Não há elementos de prova nos autos que infirmem sua versão. Não remanesce, assim, pelo que se produziu até aqui, a convicção de que ele teria aderido à conduta imputada aos corréus André e Danilton, auxiliando-os de qualquer modo para que matassem as vítimas, como narrado na denúncia”, argumentou na decisão.
Com isso, concedeu a Jorge a liberdade provisória enquanto o processo estiver em curso, tendo de comparecer ao fórum todas as vezes em que for intimado. No documento da defesa prévia, os defensores do cabo escreveram que não deu tempo de ele esboçar qualquer reação quando os colegas passaram a atirar contra as vítimas. “Este [Jorge] não teve efetiva capacidade de ação para conter os policiais que participaram do entrevero, em uma sequência de disparos de arma de fogo produzidos em aproximadamente 08 (oito) segundos”, redigiram os advogados Nilton de Souza Vivan Nunes e Ana Elisa Mônaco Rampazo.
Os advogados também pediram a soltura de André e Danilton. No entanto, o Ministério Público foi contrário e a juíza negou a liberdade dos dois ao argumentar que “o cenário fático probatório permanece desfavorável à concessão da liberdade, tendo em vista a gravidade em concreto dos fatos que lhe são atribuídos, respaldada pelo vídeo que circulou nas redes sociais”. Ambos permanecem no Presídio Militar Romão Gomes.
O vídeo que ela menciona é o gravado por uma testemunha que passava de carro pelo local presenciou parte da abordagem policial, no qual é possível ouvir 12 tiros em sete segundos. Os PMs alegaram que os jovens estavam armados e atiraram por causa do “iminente” risco de agressão. No entanto, a própria Polícia Civil indicou em relatório de investigação “indícios de execução”, o que também foi corroborado pela promotoria.
Os promotores Fabio Tosta Horner e Thomás Mohyico Yabicu apontaram que “os indiciados perpetraram crimes gravíssimos, já que, no exercício de função pública de segurança, mataram de forma impiedosa, em verdadeira ‘execução’, duas pessoas que estavam no interior de um veículo, sem que pudessem esboçar qualquer reação defensiva”. O Ministério Público ainda destacou que os acusados forjaram a cena ao dizerem que as vítimas tinham dois revólveres. A promotoria que havia solicitado a prisão de Jorge por entender, inicialmente, que ele teria auxiliado na ação.
No documento de defesa prévia, o advogado João Carlos Campanini, que representa André, alegou que o vídeo mostra apenas uma parte de uma ocorrência que durou 10 minutos e que os jovens atentaram contra a vida do policial e, por isso, o sargento teve de reagir. Ele também aponta depoimentos de possíveis vítimas de roubo que teria acontecido antes. “Ainda, com a atitude inesperada dos meliantes, os militares tiveram poucos segundos para raciocinar, evidenciando-se, com amparo nas provas acima indicadas, que os militares agiram no estrito cumprimento do dever legal”, argumentou. Ele atualmente também representa o cabo Jorge.
Já Danilton é representado por Celso Machado Vendramini, mas a reportagem não conseguiu contato e nos autos também não há registro de defesa prévia.