Matias Maxx: ‘o auge das UPPs coincide com o declínio do funk carioca e a ascensão do funk paulistano’

Entrevistado do Papo de Rap, o fotojornalista comentou da influência da cultura hip hop na própria carreira e a comparação entre as cenas do rap carioca e paulista

Matias Maxx foi o convidado do Papo de Rap de fevereiro | Foto: arquivo pessoal

O Papo de Rap da quarta-feira passada (16/2) ganhou sotaque carioca com a presença do fotógrafo, jornalista e cineasta Matias Maxx. Imerso na cena do rap no Rio de Janeiro desde a adolescência, nos anos 1990, ele começou fotografando shows e logo fez contatos com rappers como Sabotage, Black Alien e Marcelo D2. Durante a live transmitida no Instagram e conduzida por Amauri Gonzo, editor da Ponte, ele relembrou o início da carreira e falou da sua relação com a cultura hip hop e o funk.

“Antes do Zoeira [festa de hip hop que acontecia na Lapa, no centro do Rio], foi o Planet Hemp. Eu já curtia a cena radical, punk hardcore, e veio o Planet Hemp que trouxe essa fusão com o rap bem maneira”, recorda. Ao mesmo tempo que se envolvia com o rap, fez cursos de fotografia e entrou para a faculdade de Jornalismo. Em 1998, teve a oportunidade de fotografar a capa do disco Marcelo D2 apresenta Hip Hop Rio, lançado depois da festa que acontecia na capital fluminense.

Até hoje, Matias acompanha D2 em sua carreira solo e contou que uma nova colaboração com o rapper será lançada em breve. Ao mesmo tempo, o fotojornalista também descobriu e explorou outros gênero musicais. “O funk foi também o lugar onde me encontrei muito porque justamente sempre curti muito essa vibe do punk rock, do independente, do faça você mesmo. E quando eu conheci o funk, falei: nada é mais punk do que isso. É a parada mais subversiva que existe, toda a forma como o funk é organizado”, explica.

Essa mistura de ritmos foi tema de reportagens que Matias produziu para as revistas Bizz e Trip, além de entrevistas com artistas em ascensão no mundo do funk. O jornalista também uniu a cultura e os direitos humanos em coberturas para veículos internacionais como VICE, Al-Jazeera, Fusion e NatGeo. Pela VICE Brasil, foi vencedor do V Prêmio Latino-Americano de Jornalismo Sobre Drogas, em 2016, com uma reportagem crítica à pacificação do Complexo do Alemão, e também dirigiu e produziu os documentários Tudo sobre o funk 150 BPM e Gaiola LGBT.

Cena carioca e paulista

Matias Maxx viu as novas gerações do rap crescerem nas batalhas que frequentava em vários cantos do Rio de Janeiro. “O rap demorou décadas para colar no Rio. O que era música popular do Rio era o funk e ainda é. Acho que o rap começa a também ser muito consumido na favela quando ele se aproxima do funk, seja em batida ou estética”, observa.

Entre as batalhas que aconteciam em solo carioca, o fotojornalista lembra de uma que ficou marcada por premiar rappers paulistas e como eram as disputas nos bastidores por esses espaços. “Tinha o Hutúz, que era um festival organizado pela Cufa [Central Única das Favelas] que premiava rappers. Era muito louco porque era um evento no Rio dominado por São Paulo e MV Bill. O único cara do Rio que entrava na parada que era colado com o Celso Athayde era o MV Bill”, relembra.

“De rivalidade tem histórias, mas eu acho que a maior parte dessa rivalidade era uma zoeira, pelo menos do lado do carioca era sempre uma zoeira”, opina. “Em São Paulo, por muito tempo, o rap veio muito daquela escola do movimento social. Precisou os Racionais fazerem o disco Nada como um Dia após o Outro Dia para o pessoal poder relaxar. E o funk também. O funk ostentação chegando em São Paulo ajudou”.

Segundo ele, a crescente violência policial e o policiamento dentro das favelas cariocas impactaram até mesmo na presença dos bailes funk. “Se você for ver, inclusive, o auge das UPPs [Unidade de Polícia Pacificadora] coincide com o declínio do funk carioca e a ascensão do funk paulistano. Deu mais espaço para o funk de São Paulo crescer nessa época porque o funk carioca estava proibido praticamente. Depois você tem uma volta com os funks 150 BPM [marcado pelo ritmo acelerado], quando voltam os bailes”, afirma.

O rap carioca e a maconha

Em 2017, Matias ganhou uma bolsa para produzir uma série de reportagens para a Agência Pública e foi até o Paraguai investigar as plantações de maconha ilegais. Durante a conversa, o fotojornalista fala da relação da cannabis com o rap carioca: “a gente tem a influência graças ao Planet Hemp e é algo mais estético mesmo”.

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Matias fala que é um caminho diferente do que o rap paulista seguiu e traz referências até mesmo do samba carioca. “Você tem samba falando de maconha desde que samba existe. E o Planet, depois o [Marcelo] D2 no solo, trouxe muito do samba para o rap e que também entrou com tudo depois no Poesia Acústica, que é a mistura do rap com o funk, o samba, com desleixo, alto astral, tudo o que é a cultura carioca”, conclui.

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