Preso há mais de um mês, José Adriano de Souza Lima aceitou uma corrida sem saber que a passageira carregava substâncias ilícitas em sua mochila e acabou detido ao parar em uma blitz da Polícia Rodoviária Federal em viagem do RJ a MG
O promotor de Justiça Paulo Emílio Coimbra do Nascimento, do Ministério Público do estado de Minas Gerais (MPMG), denunciou no início da noite desta quarta-feira (21/7) o motorista da empresa 99 José Adriano de Souza Lima pelo crime de tráfico de drogas, com causa de aumento de pena de tráfico interestadual de drogas, com pena de cinco a 15 anos de reclusão, crime previsto nos artigos 33 e 40 da Lei de Drogas de 2006.
O motorista tem 45 anos e está preso há mais de um mês. Ele foi detido quando levava a passageira Tairiny Cristini Duarte Custódio, de 26 anos, do Complexo do Alemão, na zona norte do Rio de Janeiro, para Minas Gerais – ela transportava drogas em uma mochila. Ela também está presa e foi denunciada pelos mesmos crimes pelo MPMG.
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Na denúncia, o promotor considerou que os denunciados se eximiram da qualidade de proprietários das drogas. “Ao passo que um atribuiu ao outro tal qualidade”. Sem novas investigações o promotor embasa a denúncia no boletim de ocorrência, relatando os fatos lá narrados.
Segundo a advogada criminalista Carla de Oliveira Bejani, defensora de José, o Ministério Público está denunciando os dois e pediu agora uma produção de provas. “Agora vai abrir um prazo para a defesa de 10 dias acerca da produção de provas, na minha defesa além de manifestar acerca das produções que pretendemos produzir eu vou pedir a absolvição sumária do meu cliente, visto que o mesmo não praticou nenhum ato ilícito e apenas estava trabalhando dentro da plataforma de corridas 99”, argumenta.
A criminalista aponta que o Ministério Público pediu a quebra de sigilo telefônico dos acusados. “No caso de José Adriano não vai nem precisar porque ele forneceu a senha de acesso no dia da prisão dele na delegacia para o delegado, então a quebra do sigilo será no telefone da Tairiny. O Ministério Público pediu que o perito acesse o WhatsApp e acesse o aplicativo, puxe o histórico de corridas de José Adriano e pediu também para ser verificado se existe essa corrida do Complexo do Alemão até São Tiago, em Minas Gerais, ativa no aparelho”, explica.
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Com relação à defesa de José, a advogada afirma que agora deve proceder com um novo requerimento do ofício para a 99 apresentar o histórico de corridas do José Adriano no período de 30 dias, “para comprovar que era comum ele aceitar uma corrida de longa distância”. Carla ainda diz que vai usar declarações desencontradas da defesa da passageira: “vou juntar todas essas reportagens sobre o caso, incluindo a manifestação do advogado da Tairiny que em algumas dessas manifestações diz que a cliente dele tinha confessado ou que vai confessar, porque ele está toda hora mudando a versão”, alega.
Relembre o caso
A prisão de José Adriano aconteceu em 18 de junho deste ano, quando ele buscou a passageira no Complexo do Alemão, na zona norte do Rio de Janeiro, para levá-la à cidade de São Tiago, em Minas Gerais. José tinha o costume de pegar viagens mais longas por serem melhor remuneradas, segundo a família. A passageira informou ao motorista durante a viagem que iria à cidade mineira fazer um programa sexual e ao entrar no carro estava com uma mochila e uma bolsa.
De acordo com o boletim de ocorrência, assinado pelo delegado Paulo Felipe Gonzalez Saback da delegacia de Polícia Civil de plantão de Juiz de Fora, durante a viagem José foi parado em uma blitz da Polícia Rodoviária Federal, no encontro da rodovia BR-040 com a MG-267. O motorista então estacionou o carro, que foi fiscalizado pelo policial Fabricio Alberto Ribeiro. No banco de trás, a passageira estava ao lado de uma bolsa que guardava roupas femininas, 329 pinos e 202 frascos de cocaína e 267 “buchas” de substância semelhante a maconha.
Com Tairiny foi encontrado também R$ 460,00 em espécie, e com José foram encontrados R$ 95,00. Questionada durante a abordagem, a passageira apontou José como o dono das drogas.
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Em seu depoimento na delegacia, José reafirmou o que havia dito ao policial durante a abordagem que dirigia o carro em uma viagem do aplicativo 99, que não sabia da presença das substâncias e que a corrida ainda não tinha sido finalizada no aplicativo. Ele alegou ainda que nunca havia aceitado uma viagem para Minas Gerais, mas que ia recorrentemente a Angra dos Reis e Cabo Frio. Tairiny permaneceu em silêncio durante o seu depoimento. Ambos foram presos em flagrante.
No dia seguinte à prisão foi realizada uma audiência de custódia com a presença da juíza plantonista Ivone Campos Guilarducci Cerqueira. Durante a audiência, o motorista explicou que não sabia realmente o que a passageira carregava, por isso prosseguiu com a corrida. Após a audiência a juíza decretou a prisão preventiva de ambos.
A advogada entrou com um pedido de liberdade provisória na própria audiência e com um pedido de revogação da prisão preventiva no dia 21 de junho: o primeiro foi negado pela juíza de plantão e o segundo foi também negado pelo juiz Edir Guerson de Medeiros em 6 de julho.
No dia 29 de junho a promotora Nicole Frossard de Filippo do Ministério Público do estado de Minas Gerais (MP-MG) se manifestou pela manutenção da prisão de José Adriano. Depois dessa decisão a advogada entrou com outro pedido de habeas corpus em Belo Horizonte no dia 12 de julho, que foi liminarmente indeferido sem análise o mérito.
A Ponte, a enteada de José que o considera como pai, Lorena Zampolli disse nesta quarta-feira (21/7) que José é um homem trabalhador, casado e pai de uma filha de 14 anos ele atua como motorista de aplicativo desde 2019, após perder o emprego com carteira assinada como motorista de caminhão em abril daquele ano. “Meu pai é um chefe de família, trabalhava de domingo a domingo, minha mãe é hipertensa e passa mal com a pressão dela quase todos os dias. Emocionalmente estamos todos muito abalados, materialmente estamos tendo inúmeros prejuízos financeiros, muitos amigos e familiares que conhecem ele se solidarizaram, nos oferecendo doações para gastos com a advogada. Sem contar toda a humilhação pela qual ele está passando, sendo tratado como bandido que ele não é dentro de um presídio”, desabafou Lorena.
Procurado também nesta quarta, o advogado de Tairiny, Ulisses Sanches da Gama disse que em sede policial a passageira se reservou ao direito de permanecer em silêncio, mas que em audiência de custódia “ela confessou ser a real possuidora das drogas”. Segundo ele Tairiny “foi coagida por traficantes cariocas a realizar o transporte sob pena de ter sua vida e de um parente ceifadas por causa de dívidas”, disse em uma nota enviada à reportagem.
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Sobre a defesa de Tairiny, o advogado disse que foi impetrado um pedido de habeas corpus. “Estamos aguardando o Tribunal se manifestar, em relação ao mérito, comprovando-se cabalmente a coação física irresistível, o que configura hipótese jurídico-penal de atipicidade por ausência de conduta, pleiteamos a absolvição”. Tairiny também está presa preventivamente. Nesta quinta-feira (22), o advogado disse apenas que “a denúncia é embasada no relatório da PRF, nada mais, não houve sequer uma investigação” e não respondeu nada a respeito da suposta confissão de Tairiny.
A advogada de José Adriano contesta a afirmação e diz que o defensor da passageira está mentindo: “em momento algum a Tairiny falou sobre os fatos durante a audiência, ela permaneceu em silêncio”.
Como a audiência é virtual, nenhum dos advogados tem o registro para disponibilizar à reportagem no momento. Apesar disso, a Ponte teve acesso à decisão da juíza após a audiência de custódia, onde não é feita qualquer menção à suposta confissão de Tairiny. A última decisão judicial do magistrado Edir Guerson de Medeiros também não aponta em nenhum momento que Tairiny teria confessado ser a dona das substâncias ilícitas e nem a denúncia do MPMG.
Outro lado
A Ponte questionou a 99 sobre as acusações feitas por Lorena e pela defesa de José Adriano de que a empresa não está colaborando com as investigações, e foi respondida apenas com uma nota dizendo que “a 99 lamenta profundamente o ocorrido com o motorista parceiro José Adriano de Souza Lima. Assim que tomamos conhecimento, imediatamente mobilizamos uma equipe responsável por compartilhar as informações necessárias. Porém, pela legislação vigente, o envio de dados de usuários depende de prévia autorização das autoridades. Entramos proativamente em contato com a polícia e aguardamos essa etapa para seguir colaborando. Continuamos a postos para apoiar as investigações no que for necessário para que o caso seja esclarecido o mais breve possível.”
Questionado, o Ministério Público de Minas Gerais não quis se manifestar. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais disse que “o juiz não pode se manifestar sobre processos”.
A reportagem questionou a Polícia Civil sobre quais são os indícios de que José Adriano é perigoso para ter sua liberdade restringida e se no momento da prisão o delegado Paulo Felipe Gonzalez Saback conferiu o aplicativo do celular de José Adriano. As questões não foram respondidas. A polícia afirmou apenas que “realizou a apuração e coletou todos os elementos na investigação que resultaram no indiciamento do suspeito pela prática de tráfico ilícito de drogas. O Inquérito Policial foi relatado e remetido à Justiça”, disse em nota.