Jovem apresentou à Polícia Civil celular que, segundo advogado, mostra conversa com o namorado pouco antes do horário em que a polícia diz ter trocado tiros com ele
Um dia após a prisão dos 8 PMs suspeitos de participarem da morte de David Nascimento dos Santos, 23 anos, o DHPP (Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa) da Polícia Civil de São Paulo ouviu Cilene Geraldina dos Santos, 38 anos, mãe de David, e da namorada dele, a estudante Isabele Vieira, 18 .
David foi abordado e colocado em uma viatura do 5° Baep (Batalhão de Operações Especiais), na Favela do Areião, no Jaguaré, zona oeste da cidade de São Paulo, no dia 24/4. Duas horas depois, o corpo de David foi encontrado na Favela da Fazendinha, em Osasco, Grande SP, segundo familiares, com sinais de tortura.
O celular da namorada de David foi entregue à Polícia Civil e será periciado. Segundo o advogado Raphael Blaselbauer, que representa a família da vítima, a troca de mensagens entre o casal durante o dia e minutos antes da abordagem monta uma ordem cronológica que corrobora com as declarações da família de David e servirá como importante prova. “Mostra que o David não poderia estar em dois lugares ao mesmo tempo e não poderia de fato participar desse suposto roubo que eles relatam no boletim de ocorrência”, afirmou.
Os depoimentos começaram por volta das 15h desta segunda-feira (4/5) e terminaram quase 20h. Além da família, uma testemunha que presenciou o momento em que os PMs colocaram o jovem na viatura foi ouvida.
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Há duas investigações paralelas sobre a morte de David: uma da Polícia Militar, encabeçada pela Corregedoria da PM, e outra da Polícia Civil, feita pelo DHPP. A pedido da Corregedoria, a Justiça Militar determinou, no domingo (3/5), a prisão de 8 PMs suspeitos de envolvimento no crime. No DHPP, as investigações são comandadas pelo delegado Rodolpho Chiarelli.
As investigações apontam que os policiais da equipe do Baep E-05207, composta pelo 1º sargento Carlos Antonio Rodrigues do Carmo, cabo Lucas dos Santos Espíndola, cabo Mauricio Sampaio da Silva e soldado Vagner da Silva Borges, e da equipe do Baep E-05303, composta pelo 2º sargento Carlos Alberto dos Santos Lins, cabo Cristiano Gonçalves Machado, soldado Antonio Carlos Rodrigues de Brito e soldado Cleber Firmino de Almeida, praticaram os crimes de homicídio, fraude processual, por apresentarem vestimentas diversas da vítima, cárcere privado e falsidade ideológica.
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“A família está mais aliviada com a prisão dos policiais e o temor de sofrer uma represália diminuiu. A importância dessas prisões preventivas é assegurar a condução das investigações com mais segurança e seriedade, porque as próximas testemunhas se sentem mais seguras com isso”, disse Raphael Blaselbauer, advogado da família de David.
“O afastamento por si só não diz nada, já que ele coloca os policiais em um trabalho administrativo e livre, o que pode eventualmente atrapalhar as investigações”, completou Blaselbauer.
Ainda, de acordo com o defensor, a família está muito confiante de que o aparelho celular ajude a desmontar a versão da PM e indicar que David foi, possivelmente, “confundido com algum suspeito de ter praticado o roubo mencionado”.
Mais depoimentos estão previstos para serem feitos no DHPP, afirma o advogado. “Estamos tentando colher indícios de depoimentos de pessoas que não fazem parte da comunidade do Areião e, sim, da comunidade da Fazendinha, onde de fato aconteceu a execução. Ao que sabemos, há testemunhas que presenciaram e viram a ação dos policiais naquela comunidade”, explicou.
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Sobre as roupas de David, que a família alega que foram trocadas depois da abordagem, Blaselbauer explica: “O que se sabe até agora é que os policiais devem ter trocado as vestimentas do David, porque a família não reconhece a calça que ele estava usando e não reconhece o par de tênis encontrado junto com o corpo”.
Outro lado
A Ponte procurou as assessorias da Secretaria da Segurança Pública e da Polícia Militar para contatar a defesa dos oitos policiais suspeitos da morte de David, mas não obteve retorno.
Em nota, a SSP-SP confirmou que “a Corregedoria da Polícia Militar solicitou a prisão preventiva dos policiais militares envolvidos na ocorrência à Justiça Militar, que deferiu o pedido”.
“Os oito policiais militares, que se apresentaram na sede do órgão corregedor da instituição neste domingo (3/5), foram encaminhados ao Presídio Militar Romão Gomes. As investigações seguem tanto pela PM, como pelo DHPP”.
Nesta terça-feira, a Ponte procurou novamente a PM e SSP-SP e solicitou entrevista com cada um dos citados. A mesma nota já enviada na segunda-feira foi novamente encaminhada, sem qualquer alteração de informação e sem responder aos pedidos de entrevista.