‘Os ratos roeram a comida que mandei para minha filha na prisão’

Mãe denuncia condições de higiene da Penitenciária Feminina de Sant’Anna, na capital paulista: ‘É um absurdo que isso aconteça’

Pacote de pão que teria sido roído por ratos dentro da Penitenciária Feminina de Sant’Anna | Foto: Reprodução / Arquivo Pessoal

Entre sabonetes, absorventes, bolachas, pães de formas e outros alimentos e utensílios de higiene pessoal, Selma Ribeiro dos Santos, 59 anos, gasta cerca de R$ 600 com os materiais, conhecidos como “jumbos”, que envia duas vezes por mês para a filha que está presa na Penitenciária Feminina de Sant’Anna, na zona norte da cidade de São Paulo . Nesse valor está também calculado o valor do envio via Sedex, única forma que a Secretaria de Administração Penitenciária (SAP) autoriza para o ingresso desses tipo de produtos nas cadeias paulistas desde março de 2020, no início da pandemia de coronavírus.

Porém, Selma e outras mães de presas denunciam que nem sempre o material enviado chega às mãos das destinatárias. Além de demorar a ser distribuído depois que chegam às penitenciárias, alguns itens são barrados por agentes penitenciários e outros estragam e não servem mais para o consumo.

A Ponte teve acesso a fotos de pacotes de alimentos que, segundo os familiares, teriam sido devolvidos para eles no dia de visitas por estarem roídos. “A gente tem contato com algumas meninas que trabalham na cozinha do presídio e elas relatam que as condições de higiene e a maneira que os alimentos são guardados lá é horrível. Tem pombo, ratos e baratas lá dentro. É um absurdo que isso aconteça”, afirma Selma.

Embora a Lei de Execução Penal determine que “a assistência ao preso e ao internado é dever do Estado”, o qual é obrigado a fornecer a chamada assistência material, que consiste “no fornecimento de alimentação, vestuário e instalações higiênicas”, em todos os presídios é comum que as famílias, mesmo as mais pobres, gastem com o envio de pacotes de alimentos e itens de higiene pessoal, os “jumbos”, porque o que é fornecido pelas unidades prisionais é pouco e de baixa qualidade.

“Elas reclamam que quase sempre a comida que é servida está estragada e com o gosto azedo. Nós temos que mandar os absorventes delas porque o que a SAP manda é muito ruim e não dá pra usar. A gente manda muitas coisas, mas não é tudo que chega. Eles retiram alguns alimentos e não dizem o motivo, mas  a gente sabe que tem agente que pega pra ele”, diz Selma. 

A mãe conta que, depois de despachado em uma agência dos Correios, o “jumbo” demora cerca de dois dias para chegar até a penitenciária. Uma vez dentro da unidade prisional, o material fica muito tempo retido até que chegue às mãos das destinatárias.

Caixa do jumbo que teria sido roído por ratos dentro da Penitenciária Feminina de Sant’Anna | Foto: Reprodução / Arquivo Pessoal

Nos dias de visita, que ocorrem duas vezes por mês, os familiares só podem levar alguns alimentos preparados para serem consumidos no dia, junto com as prisioneiras. Mesmo assim, não são todos os tipos de pratos que podem ser consumido pelas custodiadas e seus parentes dentro da unidade prisional — os critérios do que é permitido ou proibido não são claros e variam conforme a unidade prisional. “Já levei pizza e panquecas para comer junto com minha filha e não foi permitido. Eles nunca dizem por que a gente não pode levar esses tipos de alimentos”, relata Selma.

De acordo com a mãe, a situação dos familiares que têm parentes presos no estado de São Paulo piorou após a pandemia, com a maior restrição das visitas e do envio de “jumbos”. Para ela, depois de uma manifestação ocorrida em fevereiro deste ano, em frente À sede da SAP, na capital paulista, o tratamento com familiares passou a ser mais rígido.

De acordo com o site da ouvidoria da Secretaria de Administração Penitenciária, os familiares devem solicitar a listagem específica de itens permitidos para envio por Sedex à unidade prisional em que seu ente querido se encontra. “Pode ser encaminhado via Sedex alimentos não perecíveis, vestuário, calçados, material de higiene pessoal e limpeza. Atualmente podem ser encaminhadas em caixas de qualquer numeração (nº 01/05) e devem obrigatoriamente pesar até 12 kg”, diz o texto da página da Corregedoria.

Outro lado

A reportagem entrou em contato com o assessoria de imprensa da Secretaria de Administração Penitenciária da gestão Rodrigo Garcia (PSDB), pedindo um posicionamento da pasta sobre as denúncias, mas não houve resposta até a publicação desta matéria.

Já que Tamo junto até aqui…

Que tal entrar de vez para o time da Ponte? Você sabe que o nosso trabalho incomoda muita gente. Não por acaso, somos vítimas constantes de ataques, que já até colocaram o nosso site fora do ar. Justamente por isso nunca fez tanto sentido pedir ajuda para quem tá junto, pra quem defende a Ponte e a luta por justiça: você.

Com o Tamo Junto, você ajuda a manter a Ponte de pé com uma contribuição mensal ou anual. Também passa a participar ativamente do dia a dia do jornal, com acesso aos bastidores da nossa redação e matérias como a que você acabou de ler. Acesse: ponte.colabore.com/tamojunto.

Todo jornalismo tem um lado. Ajude quem está do seu.

Ajude

mais lidas