‘O tempo da segurança pública é o tempo da ditadura’, diz Luiz Eduardo Soares

    Lançando o livro “Dentro da noite feroz: o fascismo no Brasil”, antropólogo participou de live da Ponte. “Para os liberais, é muito importante normalizar o fascista”, avalia

    “O bolsonarismo, para mim, é fascista, sem nenhuma dúvida”, disse taxativamente Luiz Eduardo Soares ao Da Ponte pra cá, live de entrevistas da Ponte realizada na quarta-feira (07/10) no canal de Youtube da Ponte. Autor de livros como Desmilitarizar: Segurança pública e direitos humanos, Brasil e seu duplo e seu novo lançamento, Dentro da noite feroz: o fascismo no Brasil, Soares ainda carrega a experiência de quem já atuou como secretário nacional de Segurança e atua como antropólogo e professor experiente em universidades brasileiras e estadunidenses como Unicamp, Uerj, UFRJ, Harvard e Columbia.

    Leia também: Luiz Eduardo Soares: ‘As instituições estão sendo corroídas pelo fascismo’

    O cenário caótico do Brasil corrobora sua fala. “O dragão está na garagem. O incêndio está no quarto”, avalia, em metáfora, a situação política do país. “Nós não podemos conviver na casa com um cômodo em chamas, nós não podemos com o Leviatã salivando nos nossos calcanhares, esperando a primeira oportunidade”, preveniu Soares, que avisa: “Não estamos numa situação democrática plena”

    Ele argumenta que o panorama de perda de direitos impõe uma “redefinição institucional” que nada mais é do que uma contagem regressiva. Sua análise também se lança pelo cenário internacional ao observar que o fenômeno do fascismo não é um caso exclusivo brasileiro.

    O fascismo entre nós

    Para Luiz Eduardo Soares, estamos numa situação de alerta e temos instituições coniventes com o caos fascista, pois apoiam o projeto neoliberal do “superministro” da Economia, Paulo Guedes. “Eles estão dispostos a conviver com o dragão na garagem sem nenhum problema e, por isso eles não admitem a utilização do termo fascista. Para eles, é muito importante normalizar o fascista, apresentá-lo apenas como um conservador, radical, grosseiro, bruto, rústico, mas que está disposto a modernizar o país”, analisa.

    Ele ainda observa o oportunismo das elites que foram propulsoras do autoritarismo fascistas na sociedade brasileira. “O fascismo não chegou ao poder sozinho. Nem só pela força dos integralistas, dos evangélicos ultraconservadores e dos oportunistas”, pontua Soares.

    Sua fala ainda cita a “infiltração” de fascistas nas instituições que são balizadas pela Constituição Federal, demonstrando com exemplos como aparentes casos isolados são obra desse perfil fascista.

    Segurança pública

    Outro assunto abordado durante a live foi a violência policial. De acordo com Soares, em 2019, o Rio de Janeiro alcançou um recorde triste. Segundo os números do ISP (Instituto de Segurança Pública), foram 1810 pessoas assassinadas em ações policiais. O número representa 40% dos homicídios dolosos cometidos na capital carioca e 30% dos homicídios do estado.  “Posso dizer que, no Rio de Janeiro, se a polícia parar de matar, nós tendemos a ter [uma redução] de quase metade dos homicídios cometidos”, calcula.

    O ex-secretário nacional de Segurança ainda lançou um olhar para o passado ditatorial brasileiro dos anos 60/70 para indicar que, enquanto diversas instituições migraram dos porões da ditadura para um estado democrático de direito, as polícias militares ainda permanecem como redutos de ações ilegais e violentas como se nada tivesse mudado. Para ele, esse perfil das polícias colocava em jogo a recém-nascida democracia e tem ligação com o estado atual do país.

    Leia também: Bolsonarismo ressuscitou o integralismo, dizem autores de livro sobre o tema

    Segundo Soares, enquanto o tempo da democracia criava novas possibilidades, permitia a reinvenção das instituições e oportunizava novos movimentos, “o tempo da segurança pública e justiça criminal era um tempo congelado, o tempo da ditadura. E a ditatura que, inclusive, evocava o passado escravocrata porque essa é uma história de permanências”.

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    “A Ponte faz um trabalho extraordinário desde o início. Para nós é uma referência extremamente crucial”, afirmou Luiz Eduardo Soares durante a live. Ao fim da entrevista, ele voltou a reafirmar: “A Ponte é indispensável para a resistência democrática”.

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