Grupo fez sete agentes prisionais reféns pelas condições de alimentação e saúde, além da falta de visitas; Estado argumenta que ação era tentativa de fuga
Entrega de comida estragada, falta de atendimento médico, recusa de remédios dados pelos familiares e proibição das visitas. Parentes sustentam que essas foram as motivações para rebelião no UPP (Unidade Prisional do Puraquequara), em Manaus, no Amazonas, neste sábado (2/5).
O motim teve início às 6h, quando é entregue o café da manhã. Os presidiários renderam sete agentes de segurança e tomaram a cadeia, queimando colchões. O fogo podia ser visto em bairros vizinhos.
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A ação aconteceu em meio à pandemia local de coronavírus. Amazonas registra 5.723 casos confirmados de Covid-19 na população em geral, com 476 mortos até este sábado. No sistema prisional, dados do Ministério da Justiça, divulgados pelo Departamento Penitenciário Nacional, indicam que há um caso confirmado e um suspeito.
Em vídeo, um agente prisional faz graça da situação. “Olha aí nosso presídio Puraquequara. Os moradores estão destruindo os seus apartamentos. Viu aí? Lindo e maravilhoso”, diz, enquanto registra o fogo e a fumaça.
Um dos agentes feito refém gravou vídeo com a reivindicação dos presos, que cobravam a presença “da imprensa, do Carlos Valois [juiz], do coronel Amadeu Soares [secretário da Segurança do Amazonas] e Epitácio Almeida [presidente da comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil em Manaus]”.
A Ponte conversou com a mãe de um preso. Segundo Arlete Roque, as reclamações deles são pela entrega de comida estragada, de não receberem atendimento médico na unidade e pela proibição de entrada de remédios dados pelos parentes.
“Não tem visita. Tem muita pessoa doente lá dentro e a direção não deixa entrar medicação. A Seap [Secretaria de Administração Penitenciária] diz que está liberada [a entrega], mas quando as mães vão para a frente da unidade, não deixam entrar”, diz. “Tem gente lá com tuberculose e eles dizem que tem gente com coronavírus”.
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Durante a tomada do presídio, os detentos entraram na área da cozinha e, segundo Arlete, teriam espancado quem trabalha no local pela condição da comida entregue nas celas. O filho dela trabalha na cozinha.
“É muito triste. Estou vendo pela televisão, não posso ir para lá, não fui para a frente do presídio. Fico apreensiva”, admite. “Tenho medo. Chegou a notícia que meu filho está abatido”.
Estado cita outra motivação
A Seap, comandada pelo coronel Marcus Vinícius Oliveira de Almeida, sustenta que o motivo da rebelião é outro e não as condições de alimentação e saúde dos presos. O estado afirma que havia um plano de fuga.
No total, 17 pessoas ficaram feridas na ação, segundo a pasta: dez agentes prisionais (três deles se machucaram ao pular das muralhas), cinco presos e dois policiais militares. “Todos os reféns estão bem, alguns um pouco machucados porque estavam com estoques no pescoço”, garante Almeida.
Em nota enviada à Ponte, a rebelião seria uma distração para que um grupo cavasse um túnel e escapasse do presídio.
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“O objetivo dessa rebelião era fazer uma fuga, eles estavam cavando um túnel, o que não estavam conseguindo fazer no dia a dia, distraindo a tropa para poderem fugir”, explica o secretário no documento, detalhando que houve duas tentativas anteriores de cavar túneis.
Segundo ele, a Polícia Militar e o GIP (Grupo de Intervenção Penitenciária) – similar ao GIR (Grupo de Intervenção Rápida), de São Paulo – entraram na unidade. “A tropa entrou, dominou a cadeia, ninguém ferido gravemente, só alguns policiais levaram pedradas e estão machucados”, diz o coronel.