Policiais falam em denúncia anônima e dizem que houve troca de tiros, mas morador questiona versão; um dos mortos teria envolvimento no assassinato de um PM
Policiais Militares do 39º Batalhão da Policia Militar de São Vicente, cidade no litoral sul de São Paulo, mataram dois homens durante ação de combate ao tráfico de drogas na noite de segunda-feira (23/6). Uma das vítimas é Gilvan Soares Franca, 32 anos, conhecido como “Bicudo”, e que estaria envolvido na morte do PM Cláudio Gonçalves, em fevereiro deste ano.
A ação aconteceu nos conjuntos habitacionais Primavera e Penedo, no bairro Sambaiatuba e há relatos de que a PM entrou em imóveis sem mandado. Vídeos registram o barulho de bombas enquanto o Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) resgatava os homens baleados. Moradores afirmam que houve truculência da PM durante a ação.
O boletim de ocorrência detalha que as mortes aconteceram dentro de um condomínio. Os policiais teriam inicialmente abordado um casal e encontrado maconha.
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Ainda de acordo com o relato, durante a abordagem, o rapaz teria dito onde ficaria o local em que as drogas eram guardadas. Foi nessa busca que os PMs mataram dois homens, segundo a versão deles. No entanto, no mesmo relato, os PMs falam que já haviam recebido denúncia anônima de que naquele condomínio havia a comercialização de drogas.
Os policiais Gleison Acioli Silva, Jorge Luiz Gea Correa e Sérgio Alves de Mesquita atuaram na ocorrência. Eles entraram em dois apartamentos antes de acontecer a suposta troca de tiros.
O primeiro local estava vazio, mas os PMs viram que havia um forro no corredor por onde duas pessoas fugiram. Ao verem outro apartamento aberto, entraram e localizaram os suspeitos.
Neste instante, narram os PMs ao delegado Dimas Rodaski Leão, da Delegacia de Polícia de São Vicente, Gilvan Soares Franca, o “Bicudo”, teria disparado e, no revide, foi baleado.
Vinícius Isac da Silva, 19, estava em outro cômodo e também teria atirado nos policiais, conforme a versão oficial. Os dois foram baleados pelos policiais.
Os PMs acionaram o Samu para resgatar os homens, mas ambos morreram ao serem socorridos ao Pronto Socorro municipal. Segundo a polícia, eles tinham duas pistolas: uma calibre .380, de marca Taurus, e outro .32, da marca Rossi.
Um morador questionou a versão policial. “Como que acontece uma troca de tiros dentro de um apartamento, nenhum policial ferido e o dois morrem, tem uma sangueira toda?”, indaga. “Então os criminosos são sempre maus de tiro, não acerta um policial?”.
Nas redes sociais, muitas são as mensagens de luto de pessoas que conheciam as vítimas. Na página “Vivendo na Baixada”, na publicação com a mensagem “Sambaiatuba de luto”, um rapaz escreve: “Esses dois manos eram meus parceiros. Eles se foram porque uns safados fizeram uma covardia”. Uma jovem que, pela mensagem, parece ser companheira de uma das vítimas lamenta: “Não sei como Deus permitiu isso, tantos dias e noites de luta. Passamos tudo que pudemos passar pra você deixar eu e seus filhos assim. Me corta tanto o coração de pensar como vai ser daqui para frente. Tá doendo demais”.
O condomínio em que os jovens morreram fica localizado no mesmo bairro onde quatro jovem foram mortos em operação policial no Dique do Caxeta, periferia da cidade.
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Vídeos mostram policiais jogando o que seria um corpo no mangue, ação ocorrida em novembro de 2019. Neste ano, delegado concluiu que os PMs envolvidos agiram em “legítima defesa”.
Outro lado
A Ponte questionou a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo, comandada pelo general João Camilo Pires de Campos neste governo de João Doria (PSDB), e a PM sobre a ação na cidade. Também solicitou entrevista com os policiais envolvidos na ação, lotados no 39º Batalhão de Polícia Militar.
Por telefone, o comandante do batalhão responsável pela área, tenente-coronel Dene Guimarães Martins, explicou que os policiais atiraram somente porque um dos homens fez menção de atirar e o outro deu dois tiros.
“Ele encarou, mesmo. Chegou a atirar. Por questão de segurança, por procedimento. Infelizmente tivemos duas mortes”, disse o comandante à Ponte.
Guimarães explicou que os policiais passarão por avaliação psicológica, mas que por ora seguem em trabalho de rua normalmente.