‘A política pública primordial do Estado para as favelas é a morte’, afirma Pablo Nunes, pesquisador do Observatório da Violência
Imagens feitas por celular mostram seis corpos caídos no chão, cobertos com lençóis, após ação da PMERJ (Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro) no Complexo do Alemão, zona norte da cidade do Rio de Janeiro. Ao todo, a investida da polícia, comandada pelo governador Wilson Witzel, matou 13 pessoas na favela para aprender oito fuzis.
A operação contou com a presença do Bope (Batalhão de Operações Policiais Especiais ), tropa mais letal da corporação, e tinha como objetivo apreender os armamentos. Segundo nota da PMERJ, uma denúncia anônima apontou que havia este tipo de armas na comunidade e um “criminoso, apontado como liderança do tráfico de drogas local”.
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Os policiais entraram na favela no começo da tarde junto da Desarme (Delegacia Especializada em Armas, Munições e Explosivos), da Polícia Civil do estado. Moradores contam cinco corpos foram colocados no mesmo lugar durante a operação. “Nós estamos começando a achar que é chacina”, diz uma pessoa que vive no Complexo, em áudio no WhatsApp. Todos teriam morrido no mesmo lugar, de acordo com esta pessoa.
Outro morto teria sido levado para o mesmo local, onde foram registradas as cenas pelos moradores. Havia mais mortes. Até o fim da noite, o Observatório da Segurança Pública do Rio de Janeiro contabilizava 13 vítimas no Alemão.
Desde a posse de Witzel, o Rio de Janeiro contabiliza uma morte provocada pela polícia a cada 3 homicídios registrados no estado. O ex-juiz federal colocou em ação os caveirões aéreos, como são chamados os helicópteros com plataforma de tiros, e snipers, atiradores de elite que eliminam pessoas consideradas suspeitas à distância.
À Ponte, a PMERJ contabilizou dez mortos: cinco “criminosos” que teriam recebido os policiais com tiros e granadas. De acordo com a nota, os homens foram “encontrados feridos” e morreram ao serem socorridos ao Hospital Estadual Getúlio Vargas.
Ainda segundo a corporação fluminense, um destes homens mortos “foi reconhecido como chefe do tráfico”. “O criminoso estava evadido do sistema prisional desde 2016 e era tido como um dos líderes do tráfico nas comunidades Pavão-Pavãozinho e Cantagalo, na zona sul da cidade do Rio”, argumenta a PMERJ.
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A nota contabilizou outras cinco mortes. No entanto, não explica a causa. O documento enviado pela corporação afirma que cinco pessoas mortas foram levadas até a Avenida Itaóca e que policiais da UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) Nova Brasília isolaram o local para perícia. Os policiais não explicam quem matou essas pessoas ou quem levou seus corpos até o local.
Durante a operação, enfatiza a polícia, foram apreendidas 85 granadas, drogas e oito fuzis.
Para Pablo Nunes, pesquisador do Cesec (Centro de Estudos de Segurança e Cidadania) e do Observatório da Violência, o que aconteceu no Complexo do Alemão nesta sexta-feira é “uma barbárie”, principalmente pelo motivo dado na versão da PMERJ.
“É uma motivação esdrúxula neste momento em que a favela está se virando e tentando dar respostas à pandemia de coronavírus. E ainda precisa lidar com esse tipo de violência que a polícia do RJ desfecha sem nenhum tipo de cerimônia”, analisa.
Em entrevista à Ponte, o especialista relembra que o início da pandemia representou queda de 74% nas operações policiais, ao mesmo tempo que as mortes reduziram 60%. No entanto, segundo ele, as ações como esta feita no Alemão quebram a ideia de que seria uma mudança na atuação do poder público quanto à segurança.
“Mostra qual é a política pública primordial que o Estado endereça para as favelas: a política de morte, que, por conta de oito fuzis, deixa 13 pessoas mortas, milhares de pessoas sem poder sair de casa”, afirma.
“Não é possível que favelas do RJ tem que lidar com amaça muito letal e com o coronavírus. A morte cerca as favelas do Rio de todos os lados. O Bope entrou e matou dez pessoas como se não fosse nada”, finaliza.