Comissão dos Direitos Humanos da Alerj critica governador do RJ por desvio de função ao participar de operação com snipers em helicóptero em Angra dos Reis; nos dois primeiros meses da gestão, polícia foi responsável por 1 em cada 3 mortes
O governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC), foi denunciado pela Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa (Alerj) à Organização das Nações Unidas (ONU) depois de publicar um vídeo no sábado (4/5), no qual ele acompanha uma operação na cidade de Angra dos Reis, na região de Costa Verde, em que agentes das polícias Civil, Militar e da Coordenadoria de Recursos Especiais (CORE) atiram de um helicóptero em uma comunidade.
No vídeo, Witzel diz que o objetivo é “acabar de vez com essa bandidagem que está aterrorizando a nossa Cidade Maravilhosa e de Angra dos Reis”. À Ponte, a presidente da comissão, deputada Renata Souza (PSOL), criticou a falta de uma política de segurança efetiva.
“Não há política pública de segurança no Rio, e sim um governador que se acha justiceiro e pensa que o único protocolo de segurança aplicável é o ‘mirar e atirar na cabeça’. Isso demonstra o limite em que está nossa democracia e o quanto a segurança pública não trabalha para assegurar o direto à vida e sim para colocar em risco. Essa operação expôs uma naturalização da morte como sucesso de uma ação policial, quando, na verdade, é o contrário”, criticou.
Algumas semanas após vencer as eleições, Witzel deixava claro publicamente qual seria o teor da política de segurança pública no Rio de Janeiro, quando declarou que “quem portasse fuzil deveria ser abatido”, ignorando os muitos casos em que policiais confundiram um objeto como guarda-chuva ou furadeira, com uma arma, e quando anunciou que usaria snipers em comunidades.
Os números do início da gestão de Witzel também não deixaram qualquer dúvida: em janeiro e fevereiro a polícia matou 305 pessoas, maior marca desde 1998. Isso significa que em cada 3 mortes violentas, 1 foi provocada pelas forças de segurança.
Segundo a Instrução Normativa da Secretaria de Segurança (SESEG), regulamentada em outubro de 2018 e válida até então, a atuação policial deve se pautar na promoção de direitos humanos. O documento diz ainda, no Artigo nº7, que policiais treinados estão autorizados a fazer disparos de helicópteros com armas de fogo “quando estritamente necessário para legítima defesa dos tripulantes, equipes terrestres e população civil”.
O texto apresentado à ONU caracteriza a atuação do governador como uma “política de massacre” e se assemelha ao que já tinha sido enviado, nesta terça-feira (7/5), à Organização dos Estados Americanos (OEA).
O documento faz menção ao caso envolvendo 13 mortes na comunidade Fallet-Fogueteiro, na zona norte do Rio, em fevereiro deste ano, e a morte do músico Evaldo Rosa, 51 anos, que teve o carro fuzilado com 80 tiros por militares no início de abril. A primeira reconstituição da Delegacia de Homicídios no Fallet aconteceu quase três meses depois das mortes. Na ocasião, Ministério Público e Polícia Civil afirmaram que buscavam contradições entre as versões dos policiais.
A denúncia também cita o desrespeito das operações às constituições federal e estadual ao se basearem em “crimes contra humanidade, pena de morte e tortura”.
Para Renata, o comportamento de Witzel durante a operação em Angra é problemático por mostrar um desvio de suas funções enquanto governador. “No Artigo nº 145 da Constituição Estadual, não está previsto um governador assumir a linha de frente de uma operação policial. Ele não tem poder de polícia e fere inclusive o princípio da impessoalidade por utilizar operação policial para se promover. Essas operações com helicóptero parecem ser elementos centrais para o aumento da letalidade envolvendo policiais. É um desserviço à população legitimar a pena de morte no chão da favela e da periferia”, critica.
A Ponte procurou a assessoria do governador, que destacou que “não houve mortes na operação de reconhecimento que o governador participou”. Em nota, a gestão Witzel elencou uma série de incrementos que as forças de segurança tem recebido desde que ele assumiu o governo. “O Estado ressalta que sua política de segurança é baseada em inteligência, investigação e aparelhamento das polícias Civil e Militar”. A equipe também destaca que o COE (Comando de Operações Especiais) da PMERJ trabalha com atiradores de elite muito bem treinados. “Nas ações em áreas conflagradas, a missão da Polícia Militar é primordialmente a prisão de criminosos e apreensão de arma e drogas”.
A reportagem também questionou sobre uma tenda evangélica, que segundo relatos, foi alvejada, mas a assessoria não respondeu especificamente a essa pergunta.
Em 3 anos, mortes por policiais mais que dobram no RJ
Um levantamento do Instituto de Segurança Pública (ISP), baseado em informações da Secretaria de Estado de Polícia Civil (SEPOL) e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostra um aumento progressivo na taxa de mortes por agentes de segurança entre 2012, quando a polícia matou 419 pessoas, e 2018, quando foram registradas 1.534 mortes. Entre 2015 e o ano passado, o aumento foi de 2,5 vezes (138%) na taxa de letalidade policial.
Os dados do Observatório da Intervenção – deflagrada em fevereiro de 2018 e encerrada em dezembro do mesmo ano, com um balanço de mais vítimas da letalidade policial e até casos de abusos como o estupro de meninas em comunidades – estimam que o Rio tenha tido um aumento de 56% no número de tiroteios e 1.375 mortes por intervenção policial. Nos primeiros quatro meses de 2019, houve mais de 400 mortes por agentes do Estado, segundo a Comissão de Direitos Humanos da Alerj, que destaca que esse número é o maior dos últimos 20 anos.
Em nota, a assessoria do governador Wilson Witzel lança mão dos dados do próprio ISP para considerar que a condução da segurança pública no RJ tem sido adequada. “Desde o início do ano, os números de homicídios dolosos e a letalidade violenta caíram pelo terceiro mês consecutivo, na comparação com o mesmo período do ano passado. Em março deste ano, foram registradas 344 vítimas de homicídio doloso, uma redução de 32% em relação a março de 2018. Foi o mês de março com o menor número de vítimas desde o início da série histórica, em 1991”.
A tendência na queda de homicídios no geral não é exclusividade do Rio, outros estados, como o Ceará, onde a reportagem da Ponte esteve, também tiveram esses índices reduzidos. Contudo, o governo Witzel não comentou sobre o aumento da letalidade policial.
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