Entidades repudiam violência da PM em protestos em SP e cobram Estado

    Nota denuncia que detenção ‘para averiguação’ não é permitida na legislação brasileira e aponta que repressão aumentou a partir de 2013

    Manifestação do dia 16/1 ficou mais uma vez marcada pela repressão policial | Foto: Daniel Arroyo/Ponte Jornalismo

    A truculência da Polícia Militar nas manifestações contra o aumento da tarifa na cidade de São Paulo, organizadas pelo MPL (Movimento Passe Livre), demanda apuração e responsabilização.

    É o que dizem as entidades Artigo 19, Conectas Direitos Humanos, Condepe (Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana do Estado de São Paulo) e IBCCRIM (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais) em nota de repúdio (veja a nota completa aqui).

    Os três primeiros atos realizados nas últimas duas semanas foram marcados por violência e detenções contra manifestantes e até jornalistas. No primeiro ato do ano, realizado no dia 7 de janeiro, mais de 30 manifestantes foram detidos “para averiguação” – prática não permitida na legislação brasileira e internacional -, sendo que três foram autuados por desacato e dano. Entre os detidos estava o fotógrafo Rodrigo Zaim.

    Dois dias depois, no dia 9 de janeiro, a imprensa foi alvo mais uma vez. Dessa vez, o repórter Arthur Stabile, da Ponte, e Lucas Martins, dos Jornalistas Livres, foram revistados na concentração da manifestação, mesmo identificados como mídia. Nesse dia, a PM usou gás para dispersar a manifestação e atingiu crianças na estação República, linha vermelha do Metrô.

    No último ato, realizado no dia 16 de janeiro, a PM arrastou mulheres pelo cabelo e pelo pescoço. Dez manifestantes foram detidos nesse dia, entre eles a ativista Andreza Delgado, criadora do PerifaCon.

    Em entrevista à Ponte, Dimitri Sales, presidente do Condepe, uma das entidades de direitos humanos signatária da nota, alertou que a repressão tem um objetivo muito claro: intimidar os manifestantes.

    “Isso é inconstitucional, eles não podem impedir que as pessoas saiam pedindo os seus direitos. O que chama atenção para a gente é entender por que o Estado de São Paulo é tão resistente às manifestações. Há um espírito autoritário tomando conta de São Paulo. Na última manifestação a impressão que tinha era que havia mais policiais do que manifestantes”, aponta Dimitri.

    Para Sales, a discussão sobre o aumento da tarifa é fundamental, pois interfere diretamente na vida do cidadão. “Quanto que se gasta em armamento não letal para reprimir manifestações? Os protocolos de bala de borracha são próprios, será que estão sendo cumpridos? Não temos como responder, pois eles são mantidos em sigilo”, critica Dimitri.

    O advogado Guilherme Ferreira, da Artigo 19, afirma que o decreto que regulamenta a lei 15.556/2014, assinado pelo governador João Doria (PSDB) em janeiro de 2019, que restringe o uso de máscaras ou “qualquer outro paramento que oculte o rosto da pessoa em protestos”, legitimou a violência policial nas manifestações.

    “Dados os últimos três atos, percebemos que essas restrições usam uma nova roupagem que vem através da legalidade do decreto do Doria. Esse decreto, entre outros pontos, traz a obrigatoriedade do aviso prévio para as manifestações com mais de 300 pessoas, ou seja, todo ato e passeata não espontâneo tem que ter um aviso prévio aos órgãos competentes, com vários requisitos, que além de serem abusivos, trazem uma insegurança para os manifestantes, porque você dá informações pessoais”, exemplifica Guilherme.

    Desde o ano passado, organizações de defesa dos direitos fundamentais no Brasil se mobilizam para denunciar os efeitos do decreto. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos e relatórios especiais da ONU (Organização das Nações Unidas) chegaram a se pronunciar no fim do ano passado no sentido de que o decreto precisava ser revogado.

    Para o advogado, apesar de historicamente o Brasil violar o direito de protesto, depois das jornadas de 2013, isso aumentou. “Monitoramos os protestos e conseguimos perceber que houve um recrudescimento dessa restrição de direito de protesto. Isso culminou em várias ações de repressão, de criminalização de ativistas e defensores de direitos humanos”, crava.

    “A nossa preocupação é denunciar essas violações, pedir uma responsabilização e a revisão das práticas do Estado na condução de manifestações. Isso perpassa por uma revisão e um olhar cuidadoso sobre esse decreto, que veio para reprimir as manifestações massivas que aconteceram em 2013. O governo quis dar uma resposta e a gente questiona se essa resposta é a mais correta, a que mais garante a liberdade de expressão e do direito de os cidadãos reivindicarem por direitos básicos”, aponta Guilherme.

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