Leona Jhovs: ‘Faço tudo o que eu quiser, porque posso ser tudo na vida’

    A artivista trans paulistana foi a convidada do último episódio do Pluralidades, série de lives da Ponte, em 2020: “A transição não para”

    A definição profissional que Leona Jhovs atribui a si mesma não poderia ser melhor: multi-artivista, afinal ela é atriz, cantora, roteirista, diretora, apresentadora e todas essas experiências perpassam por sua vivência como mulher transfeminista. “Faço tudo o que eu quiser, porque posso ser tudo na vida, menos ser cis”, afirma. Além de tudo isso, ela é co-fundadora da Casa Chama, organização-espaço pensada e criada por e para pessoas trans. Convidada para o último episódio de 2020 da série de lives Pluralidades, Leona falou sobre sua trajetória e seus trabalhos. Apresentado por Caê Vasconcelos, o programa foi ao ar na última quarta-feira (16/12) e pode ser visto na íntegra no canal do YouTube da Ponte Jornalismo.

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    “Se você me perguntar quando a Leona surgiu, eu não sei te dizer porque é um processo de percebimento que vai acontecendo e a gente não se dá conta”, reflete. Para ela, apesar de existirem as dificuldades para fazer a transição, ela teve “essa vantagem de ter tido essa família que me deu acesso ao afeto, que é algo que é tão negado a todos nós”. Esse apoio garantiu acesso a direitos básicos como educação, saúde e alimentação e permitiu que ela estivesse fortalecida para ocupar lugar e se tornar uma referência. “Me posicionei para o mundo enquanto uma mulher aos 27 anos. Hoje, eu tenho 33 e, de lá pra cá, tem sido sempre uma descoberta. A transição não para”.

    Um pouco da trajetória de Leona é contada na videoperformance “Avesso-Interno-Belo“. “Deixei nascer de mim para mim”, explica. Ela conecta o passado que estava guardado com a ligação que tem tido com crianças trans. “É importante pontuar que elas estão vivenciando algo que as gerações anteriores não puderam. Elas estão tendo o direito de vivenciar a infância trans”. O retorno que os pais dessas crianças dão a Leona é sempre voltado para a imagem dela como referência para os pequenos. “Quando eles veem essa nova geração de transvestisgeneres ocupando lugares de poder, eles têm a gente como referência e acabam levando a nossa figura para essas crianças “.

    Artivista

    De família de artistas, ela enxerga que a arte sempre esteve ali, presente na sua vida. Passou pelo balé clássico e seguiu para a dança, foi quando descobriu que tinha “a necessidade de viver no palco”. A estreia no teatro foi ainda na escola, em um dia marcante: 11 de setembro de 2001 quando substituiu um colega em uma apresentação externa com o grupo de teatro do colégio onde estudava. “Esse dia foi o primeiro dia que eu pisei num palco de teatro me propondo a atuar”.

    Em meio a uma crise depressiva e planos para sair do país, Leona encontrou a Companhia de Teatro Faroeste. E ali, passa a entender que seu corpo como político. “Ali fui me construindo como artivista”. Permaneceu no grupo por sete anos, tendo ocupado posições desde a bilheteira até chegar a atuar com o elenco.

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    E Leona atuou em múltiplas frentes. Em 2017, integrou junto com outros o movimento Representatividade Trans para combater a prática do transfake que é quando uma produção coloca artistas cis para interpretar pessoas trans. 2018 foi o ano em que ela migrou do teatro para atuar no cinema. No ano seguinte, ela se viu dirigindo e escrevendo roteiros, ocupando cada vez mais espaços.

    Sua trajetória vem sendo reconhecida pelo público e pela crítica. Esse ano, ela ganhou o Prêmio de Melhor Atriz na mostra Suzy Capó do VI Festival Internacional de Cinema da Diversidade Sexual e de Gênero de Goiás. O filme “Modelo morto, modelo vivo“, dirigido, escrito e atuado por ela, ganhou menção honrosa na 3ª edição do Festival de Cinema de Santa Teresa – ES. O curta também levou o prêmio de melhor filme LGBT do Sweden Film Awards.

    Casa Chama

    “Nós por nós” é o lema que Leona atribui para a Casa Chama, organização civil que busca dar apoio a pessoas trans em áreas como da saúde, da justiça, e das artes. No site, a instituição, que foi criada em 2018, se descreve como “associação cultural de cuidados LGBTQIAP+ plural e fluida, que surgiu da necessidade de criar mais espaços de pesquisa, discussão e ação”.

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    Segundo Leona, durante a pandemia, houve um aumento nas doações, o suficiente para que a Casa Chama ajudasse 800 pessoas com o que chamam de cestas dignas, pois além do básico, o kit tinha artigos de limpeza, carnes, produtos de higiene pessoal. “A gente está construindo essa rede de afeto e resistência para nós e por nós”.

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