Maria Célia de Jesus Gomes foi atingida no abdômen a cerca de um metro de distância por uma bala disparada pelo policial militar Saulo Fernandes Balduino em Passos (MG) nesta sexta-feira (13)
Maria Célia de Jesus Gomes, de 49 anos, teve que passar por uma cirurgia no intestino na última sexta-feira (13/8) após ser atingida por um tiro de bala de borracha em seu abdômen quando perguntava a um policial militar porque seu filho era levado preso. O caso ocorreu na cidade de Passos, em Minas Gerais, estado governado por Romeu Zema (Novo), quando policiais perseguiram o filho da doméstica Maria Célia, Vinicius Péricles Gomes, 21 anos, indiciado por participar de um roubo.
Segundo o pedreiro e marido de Maria Célia, Adriano José Rodrigues, 41 anos, o PM Saulo Fernandes Balduino o ameaçou após já ter atirado em sua esposa. “Eu vi quando o tiro atingiu ela e ela começou a subir com a mão no abdômen, eu perguntei: ‘Tinha necessidade de dar tiro nela?’ E o policial disse: `Tinha, você quer tomar um também?’”. Um vídeo que circula nas redes sociais mostra o momento em que o PM atira em Maria Célia.
Segundo Adriano, a bala de borracha atingiu o intestino de Maria Célia, que ainda está hospitalizada. “O intestino dela foi colado e ela está usando uma bolsa, eu vi o intestino dela saindo para fora, achei que ela poderia ter morrido. Os PMs não queriam ajudar a socorre-la”.
Ele relatou à Ponte que os policiais militares invadiram sua residência sem mandado. “A Célia abriu o portão da garagem, ele entrou com o carro e ela fechou o portão, nisso escutamos o barulho de sirene, ela então abriu o portão social, e o policial chegou invadindo.”
Adriano ainda diz que um dos policiais passou a perseguir Vinicius, que pulou um muro em direção a casa vizinha, nesse momento um dos policiais teria atirado. “O Vinicius já estava aqui dentro e tentou sair, o policial disse: ‘Não corre não’ e começou a caminhar para se entregar, quando ele foi se entregar o policial deu um tiro para cima, dentro do meu terreno. Ele saiu correndo e pulou o muro que faz divisa com o vizinho. No muro da vizinha tem uma marca de tiro e a marca não é bala de borracha.”
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Assustado, o casal desceu a rua Locuba Portal das Palmeiras, onde perguntavam o que estava acontecendo. “Não falaram nada, quando descemos ela viu o filho dela rendido no chão, ela perguntou o que estava acontecendo e o policial apenas virou e deu um tiro nela”, diz. Maria Célia tem um quadro de saúde estável, ainda sem previsão de alta segundo familiares.
O advogado de Maria Célia, Roberto Junqueira, pretende entrar com uma representação criminal perante o Ministério Público Estadual (MPE), a Corregedoria da Polícia Militar e a Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de MG. Junqueira afirmou ainda que Adriano, companheiro de Célia não conseguiu abrir o boletim de ocorrência na delegacia da cidade. “A Polícia Civil está investigando por tabela, o caso aconteceu na sexta-feira e até hoje o projétil que atingiu ela ainda estava na Santa Casa, não tive acesso. Dizem que a bala de borracha não é letal mas ela é sim, ela é menos letal, ela é projetada para se atingir alvos a 20 metros de distância e não a um metro. Foi totalmente desproporcional, ela estava parada quando levou o tiro. O Adriano tentou registrar o caso na delegacia mas disseram que já tinha um boletim de ocorrência”.
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De acordo com o BO, assinado pelo delegada Grace Renata Cunha Paulo da Delegacia de Polícia Civil de Passos, em 13 de agosto de 2021, por volta das 11 horas, dois produtores rurais, relataram que, na noite anterior, por volta das 20h, quatro pessoas haviam comparecido em seu sítio, onde os supostos roubadores os renderam junto de duas crianças da família, sendo uma de sete e outra de dois anos, passando a exigir dinheiro das vítimas ameaçando-as com armas de fogo.
O documento diz que as vítimas relataram que posteriormente, “um dos autores apoderou-se de um veículo da família”, levando as vítimas para um bairro chamado “Favela do Arrozinho” na cidade de Passos, mantendo-as em cárcere privado, enquanto uma das vítimas foi levada, pelos outros autores, até uma agência bancária também no mesmo município, em um outro veículo da família, “onde sofreu várias ameaças, inclusive, envolvendo as crianças que estavam retidas como reféns”.
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Sem conseguir realizar o saques, os autores teriam liberado as vítimas levando os dois veículos pertencentes à família, exigindo a quantia de R$ 5.000 para que o carro fosse devolvido às 10h da manhã do dia seguinte (13/8).
Com isso, a Polícia Militar realizou cerco e bloqueio nos locais próximos. De acordo com o BO, em determinado momento, quando PMs avistaram o veículo roubado na estrada Passos – São João Batista do Glória, os dois suspeitos desembarcaram e saíram correndo em um bairro próximo à rodovia. Ambos foram alcançados e presos pelos policiais.
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Ainda segundo o documento, os outros dois suspeitos foram localizados e presos enquanto estavam esperando o pagamento da extorsão no centro de Passos, próximo a uma agência bancária. Nesse momento, Vinicius, de acordo com o BO, fugiu em um veículo roubado sendo perseguido e preso ao tentar entrar em sua própria residência, “local onde foi apreendida uma das armas de fogo que foi utilizada no crime”.
Diferente da versão contada pela família, os policiais alegam que os familiares de Vinicius “resistiram ativamente à execução da prisão, tentando, inclusive, a arrebatarem a arma de um dos militares, sendo necessário fazer uso de força moderada com disparos de arma de menor potencial ofensivo (munição de elastômero), vindo a atingir genitora do autor (Maria Célia), na altura do abdômen”.
O BO afirma que Maria Célia foi socorrida à Santa Casa de Misericórdia da Passos pela viatura da PM, junto aos policiais Wesley Corsi e Erick da Silva Cruz. Todos os suspeitos foram presos e levados à Delegacia de Polícia Civil de Passos, onde foram autuados e levados para o presídio local. A delegada registrou um auto de resistência relacionado ao “emprego da força” utilizado pelos policiais Carlos Eduardo Quinelatto e Saulo Fernandes Balduino para “conter chutes e socos nos militares”.
Segundo o advogado de Célia, a tese da legítima defesa não se aplica a esse caso. “A legítima defesa é ser usada para conter uma agressão injusta atual ou iminente, não tem nada disso nesse caso. Ela vai em direção aos policiais normalmente, não tem nada nas mãos, ela se identifica como mãe do rapaz. É lamentável, que mostra o racismo estrutural, Célia é uma mulher negra e pobre que cuida da mãe que está doente.”
Outro lado
A reportagem questionou a Polícia Militar de MG em relação à abordagem dos policiais e aos procedimentos que serão realizados com o PM Saulo Fernandes Balduino que disparou contra Maria Célia e aguarda um posicionamento.