PM é condenado por lesão corporal após jogar cassetete em jovem que bateu moto e morreu

Vitor Cleace, 21 anos, morreu em maio de 2021 após atingir poste na zona sul de São Paulo; soldado André Luiz Ferreira de Santana cumprirá pena em regime aberto

Vitor Cleace tinha 21 anos quando morreu após bater em um poste depois de ser atingido por cassetete arremessado por PM | Foto: Arquivo pessoal

O policial militar André Luiz Ferreira de Santana, 32 anos, foi condenado a um ano e sete meses de prisão em regime aberto por lesão corporal por atingir com um cassetete a moto que Vitor Cleace, 21, dirigia na região do Capão Redondo, na zona sul da capital paulista, em 16 de maio de 2021. Ele  perdeu o controle do veículo, bateu contra um poste e morreu no hospital. O julgamento ocorreu na segunda-feira (22/5) em análise da 4ª Auditoria Militar Especial. A decisão é passível de recurso. 

Na garupa estava um adolescente de 17 anos que sofreu escoriações. Em depoimento à polícia, ele relatou ter sentido o impacto de algo colidindo contra a motocicleta. O jovem também contou que Vitor estava em alta velocidade. 

A cena foi flagrada por câmeras de segurança de um mercado próximo ao posto de gasolina onde a viatura da Polícia Militar estava estacionada. A Ponte teve acesso ao conteúdo. Nas imagens é possível ver o soldado André jogando um objeto em direção a uma moto que passava. 

Na sequência, o motociclista perde o controle e bate em um poste. Vitor chegou a ser encaminhado com vida ao hospital do Campo Limpo, mas não resistiu. 

O auxiliar de administração Vinícius Gomes Cleace, 26 anos, irmão de Vitor, diz que a família está indignada com o resultado do julgamento. “Dá uma tristeza. Parece que toda a batalha que fizemos desde o começo até agora não valeu a pena”, lamentou Vinícius. 

Em entrevista anterior à Ponte, Vinícius contou que Vitor estava numa festa horas antes de morrer. Ele pegou a moto emprestada de um amigo, segundo o irmão, para ir ao banheiro em sua casa. Moradores da região do Capão Redondo protestaram e também passaram pelo local onde Vitor morreu. Um ônibus chegou a ser queimado e fogo foi ateado em pneus na rua.

Segundo o boletim de ocorrência, o PM André Santana disse que ele e o colega David Rodrigo Ribeiro, 32, receberam a informação de um roubo na região e suspeitavam da moto em alta velocidade ocupada por duas pessoas “sem capacete somente com blusa de capuz e cobertos, e que tinha uma sacola preta tampando a placa”, relataram.  

Eles teriam suspeitado também de um “volume na cinta” do condutor da moto. O motivo de ter jogado o cassetete, na versão do policial, foi porque o piloto teria jogado a moto para cima dele e do colega. 

A versão é desmentida pelas imagens da câmera de segurança. O vídeo mostra que foi o PM André quem andou em direção da moto e jogou o objeto. No BO, os PMs relatam ainda que o “volume na cinta” era, na verdade, a carteira com os documentos de Vitor. 

As câmeras instaladas nas fardas dos policiais André e David estavam desligadas quando o jovem morreu. Ambos atuavam no 37º BPM/M (Batalhão de Polícia Militar Metropolitano), que, na época dos fatos, usava equipamento diferente dos adquiridos pelo governo paulista. O modelo, então em teste pelo 37º BPM/M, é diferente dos adquiridos pelo governo paulista em 2021, que são do Consórcio Axon Advanta e cuja gravação é ininterrupta por turno de 12h. Os aparelhos da Motorola haviam sido doados à PM por chamamento público em 2019. A ausência dessas imagens foi percebida ainda na fase de inquérito policial pelo delegado Antonio Carlos Renno Miranda. 

O julgamento foi para a Justiça Militar depois que o promotor Thomas Mohyico Yabiku e o juiz Marcus Alexandre Manhães Bastos, da 3ª Vara do Júri, concoradram que não houve dolo (intenção de matar) na ação do policial em atirar o cassetete na moto em alta velocidade. Por isso, o magistrado determinou a redistribuição do caso a outra vara criminal por não haver crime contra a vida. 

O julgamento ocorrido na segunda-feira (22) também condenou o PM David Rodrigo Ribeiro. A pena, no entanto, foi distinta da de André. Ele foi condenado por fraude processual, crime previsto no artigo 312 do Código Penal Militar.

“Omitir, em documento público ou particular, declaração que dêle devia constar, ou nêle inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato jurìdicamente relevante, desde que o fato atente contra a administração ou o serviço militar”, diz o texto da legislação. 

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Pelo crime, David foi condenado a um ano e três meses de prisão em regime aberto. No julgamento desta segunda (22), o promotor Marcel del Bianco Cestaro pediu a condenação de ambos os policiais. A sentença foi proferida pelo juiz José Álvaro Machado Marques. 

Outro lado

A Ponte procurou o advogado Gilberto Quintanilha Pucci, que representa os soldados André Santana e David Ribeiro. Ele afirmou que vai recorrer da sentença e culpou Vitor pela própria morte. Veja a nota compartilhada pela defesa: 

“Com relação a ao Sd André Luiz a defesa irá recorrer do resultado uma vez que a fatalidade aconteceu por culpa da própria vítima, uma vez que transitava em altíssima velocidade, na contramão de direção e principalmente sem capacete, se auto colocando em risco. 

Já com relação ao Sd David foi demonstrado pela defesa que houve sim a tentativa de abordagem por ele, a qual consta no próprio vídeo sendo desobedecida pela vítima Vitor o que foi inserido no BOPM.”

A Ponte também procurou a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP-SP) questionando a respeito do caso, mas não obteve retorno até a publicação. 

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