Leandro Prior ficou conhecido após receber ameaças de outros PMs e ataques homofóbicos quando foi gravado beijando colega em 2018; três anos depois, o soldado decidiu deixar a corporação por causa de perseguições e ao se ver em crises de ansiedade e depressão
Atenção: esta reportagem trata de saúde mental, ansiedade, depressão e pensamentos suicidas – que podem gerar gatilhos. Caso você não esteja bem e precise conversar com alguém, a Ponte recomenda entrar em contato com o Centro de Valorização à Vida (CVV), que funciona 24 horas e pode ser acionado através do telefone 188 (ligação gratuita) ou neste site, ou uma unidade mais próxima de saúde que você pode encontrar por meio do Mapa Saúde Mental.
Um selinho em um colega alçou a foto e o nome de Leandro Barcellos Prior, 30, a sair do anonimato em julho de 2018. A cena no metrô de São Paulo reverberou em reportagens jornalísticas e principalmente nas redes sociais, onde chegou a receber ameaças e ataques de colegas de farda e foi criticado até pelo então governador em exercício Márcio França (PSB). “É preciso ver que a farda é uma extensão do Estado e a farda tem que estar respeitada. Eu não vejo significado de você usar coldre, farda, e ficar fazendo gestos de amor expresso em público, seja com homem ou com mulher”, declarou França na época ao jornal O Estado de S. Paulo.
O episódio fez com que Prior fosse visto de outra forma pela corporação e, ao mesmo tempo, deixava às claras, como ele define, a homofobia presente dentro das fileiras militares. “Foi ali o estopim das ameaças de policiais de vários lugares, em especial da Rota, e que começou o meu processo de ansiedade aguda e depressão”, conta. E também do que fazer com a exposição que havia adquirido de forma involuntária. “Eu fui obrigado a assumir uma posição de luta, de defesa, e o reconhecimento veio automaticamente, mas nunca foi o meu objetivo”, prossegue.
De lá para cá, a reportagem noticiou sobre as ameaças e perseguições que o soldado sofreu, incluindo a proibição do comando da PM de usar a farda em um pedido de casamento ao seu companheiro em 19 de junho de 2019, data que marca a Revolta de Stonewall, série de manifestações da população LGBT+ ocorrida em 1969 nos Estados Unidos, contra a tortura da comunidade por parte da Polícia de Nova York, e também mês do Orgulho LGBT+ no Brasil. Mesmo com a negativa, Prior fez o pedido fardado. A Ponte revelou que ele havia sido espionado por policiais à paisana.
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De acordo com Prior, foram 18 apurações abertas contra ele na corporação desde então, entre sindicâncias, procedimentos administrativos, processos disciplinares e inquéritos policiais militares. Algumas delas, a respeito de lives que participou sobre discussão de bolsonarismo e polícias ou sobre a carreira policial em si. A mais recente delas, que a Ponte teve acesso, foi a abertura de uma investigação preliminar em abril deste ano na qual o major Marcelo Albuquerque Ramos da Silva solicita a apuração de “incapacidade moral” de Prior para permanecer na instituição.
A base foi primeiro um post da deputada estadual Monica Seixas (PSOL-SP) no Twitter, onde dizia que “é um absurdo que o PM @leandropriorsp seja perseguido na corporação por defender causas democráticas”. A partir disso, foram juntados prints do perfil no Twitter do soldado e ele foi questionado sobre uma denúncia anônima à Corregedoria da PM que tratava de postagens de Prior chamando o presidente Jair Bolsonaro de “genocida” e o uso de fotos com farda nas redes sociais.
O major escreveu que “configura transgressão disciplinar, pois o militar do Estado ao reafirmar o seu entendimento de que o Presidente da República Jair Bolsonaro, ‘no que diz respeito a pasta da saúde, traz consigo na sua política de atuação estética genocida’ fere o dispositivo expresso no nº 42 do Artigo 13 do RDPM [Regulamento Disciplinar da PM]”, que trata de desrespeitar autoridades em público.
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Dois meses depois, o soldado decidiu pedir exoneração da PM, que foi acatada na semana passada, e afirma que não contou com apoio psicológico da instituição. “Essa corporação adoece e adoece com facilidade aqueles que entram”, disse. De acordo com dados obtidos pela Fiquem Sabendo, agência especializada em Lei de Acesso à Informação, de janeiro de 2020 a abril de 2021, 1.647 licenças de afastamento por transtornos mentais foram aprovadas pela PM paulista. Numa comparação entre abril de 2020 e abril de 2021, a concessão de licenças quase dobrou, de 82 para 151.
Prior conversou com a Ponte, por telefone, sobre os últimos três anos, saúde mental na PM e a decisão de deixar as fileiras militares.
Ponte – A partir de que momento você decidiu sair da PM?
Leandro Prior – Não foi uma coisinha em especial, foi o conjunto da obra. São três anos tendo que aguentar humilhações, perseguições, oficiais da Polícia Militar cedendo ao entusiasmo e capricho de deputados estaduais bolsonaristas e chegou um dado momento em que eu estava adoecendo emocionalmente, psicologicamente, e eu percebi. Eu, dentro da Polícia Militar, já tive depressão profunda, já fui internado, passei por processo medicamentoso. Depois, fui da psiquiatria para a psicologia, me livrei da depressão profunda, me livrei da ansiedade aguda. Eu tinha uma ansiedade em que a minha musculatura atrofiava de tão forte. Então, eu conhecendo os quadros de ansiedade e depressão, eu percebi que eu estava mais uma vez adoecendo, que a Polícia Militar estava me adoecendo mais uma vez. Foi o momento em que eu decidi que ali não era o meu lugar porque aquele lugar adoece até que você ou se mate ou mate seu comandante.
Ponte – Você sentia isso antes do episódio do beijo?
Leandro Prior – Quando eu estava na Polícia Militar sem visibilidade, como um desconhecido na sociedade, eu não tinha nenhum problema com ansiedade, com depressão, com estresse. Eu não tinha nenhum tipo de perseguição, seja pelas minhas convicções políticas, que todo mundo sabia das minhas convicções, não tinha problema nenhum em torno da minha orientação sexual, as pessoas sabiam. Tanto que não há nenhum tipo de procedimento, processo, investigação aberta antes daquele episódio, em 2018, do beijo no metrô, que foi o precursor da minha visibilidade. Foi ali o estopim das ameaças de policiais de vários lugares, em especial da Rota [tropa mais letal da PM paulista], que começou o meu processo de ansiedade aguda e depressão.
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Passei dois anos de terapia, até conseguir desmamar dos remédios, conseguir pegar o apto pleno [uso da arma]. Após pegar o apto pleno e voltar à atividade, ainda neste ano [em março, já que teve restrição em agosto de 2020 ao apresentar um atestado], eu percebi que eu mais uma vez, por causa das atitudes dos meus comandantes, em especial do tenente-coronel Gomes, que é o subdiretor da DPCDH (Diretoria de Polícia Comunitária e de Direitos Humanos), e do coronel PM Leandro, que é o atual diretor, culminou no meu adoecimento mais uma vez.
Ponte – Que tipo de atitudes?
Leandro Prior – Primeiro que, após a abertura de diversos procedimentos, diversos inquéritos me imputando crime, abertura de sindicância, apreensão do meu computador de serviço para apurar se eu utilizava os meios da PM de modo errôneo, foi periciado pela Diretoria de Tecnologia que viu que eu não usava o computador da PM para absolutamente nada que não fosse aquilo que eu fazia em serviço. O que é um absurdo porque se você pegar os computadores de todo mundo tem coisas particulares e usam para outros fins. Se fosse assim, toda a diretoria de Direitos Humanos seria mandada embora para rua. Eu quando faço alguma coisa particular, eu uso o meu celular.
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Após esse processo de humilhação da Diretoria, eu vi que eles abriram um PAD (processo administrativo disciplinar) com o intento de me demitir. Estou há três anos lutando contra 36 policiais identificados que foram homofóbicos e me ameaçaram de morte. Policiais que cometeram crime e a Polícia Militar não fez nada. Não abriu procedimento para apurar se esses policiais têm moral suficiente para o exercício da função. Enquanto eu, a vítima, que passei pelo processo de humilhação, de exposição contra a minha vontade porque eu nunca quis ser um ícone de luta, nunca foi meu intento, se fosse, eu seria desde que eu entrei na Polícia. Eu fui por causa da porcaria do vídeo do metrô. Eu fui obrigado a assumir uma posição de luta, de defesa, e o reconhecimento veio automaticamente, mas nunca foi o meu objetivo. Após visualizar que a PM estava penalizando a mim, tentando me mandar embora, e aqueles que cometeram crimes ela não estava fazendo nada, ela estava chancelando que aceita homofobia nas suas fileiras, aquilo me deixou muito apreensivo.
Ponte – E depois?
Leandro Prior – O estopim final se resume em duas partes. Eu já estava com apto pleno [em março de 2021] e o meu comandante não devolvia o meu armamento. Sem o meu armamento, eu não faço DEJEM e Delegada [DEJEM é o pagamento de um valor diário por venda de folga ao governo do Estado; já a Operação Delegada é um convênio entre a prefeitura da capital e o Governo do Estado para reforçar o policiamento na cidade em que os policiais também vendem suas folgas]. Todos da Diretoria, com raríssimas exceções, vendem suas folgas e pedem DEJEM e Delegada e eu não podia fazer. Se eu tenho condições agora de portar uma arma, de trabalhar, por que não me colocar na rua? ‘Porque eu não quero, porque eu não permito’, essa foi a resposta do meu comandante. Ele abriu um procedimento para apurar se eu tenho moral suficiente para estar nas fileiras e, pelo fato de eu ter esse processo que ele mesmo abriu, eu não posso estar armado. Então não consegui vender folga e o meu salário ficou seco [o salário de um soldado de 1ª classe é R$ 3,8 mil bruto e R$ 2,5 mil líquido].
Aí vem o ponto final: a minha mãe, desde os meus 16 anos, não pedia dinheiro emprestado. Eu saí de casa com 16 anos de idade. E ela falou ‘filho, a situação está apertada aqui no litoral, teria como você me emprestar R$ 300 para a gente fazer uma compra?’. Aquilo cortou o meu coração e eu não tinha os R$ 300. Eu estava contando moeda em São Paulo há meses porque eu não estava fazendo DEJEM e Delegada e o salário medíocre e completamente defasado me permitia sobreviver e não viver. Nisso, eu falei para a minha mãe ‘olha, infelizmente eu não tenho condições de mandar’ e aquilo me cortou o coração. Aí eu coloquei a mão na consciência e [pensei] ‘é realmente nisso que eu quero estar?’. Eu falei para mim ‘não, eu vou botar um ponto final nisso’. Eu tomei coragem de acabar com esse relacionamento tóxico de sete anos.
Ponte – Você já pensava em deixar a PM antes?
Leandro Prior – Eu já havia conversado com a minha psicóloga, com a minha psiquiatra e elas diziam que, dentro do Estado Democrático de Direito, você tem todo o direito de estar na Polícia Militar, de ser uma LGBT e de ser um policial progressista, de esquerda, só que aquele ambiente está te adoecendo. As duas diziam que não podemos esquecer que a corporação da PM neste estado é a que tem o maior índice de suicídio. Essa corporação adoece e adoece com facilidade aqueles que entram. A questão não é se você merece estar na PM, se você faz jus, se você é ou não digno, é direito seu, você passou no concurso, é o teu emprego, mas está te adoecendo.
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No ano passado, eu já tinha saído de um quadro suicida, onde num ápice das perseguições, eu peguei minha .40, enfiei na minha boca e apertei duas vezes. A sorte, e eu agradeço a Taurus do Brasil pela qualidade do armamento, não funcionou. Eu já estava num processo agora em que eu não ia me matar, mas já tinha plena ciência de que eu mataria os meus comandantes, então para que eu não sujasse a minha história, para que eu não sujasse as minhas mãos de sangue, para que eu não fosse hipócrita em torno daquilo que eu luto e acredito, e não desse desonra à minha família, eu preferi sair. Só saindo eu pude contemplar o quão bem isso está me fazendo, que é sair de um relacionamento financeiramente abusivo, é você precisar de um ganhã-pão, precisar do dinheiro, e não ter como sair porque você fica dependente.
Ponte – Essa psiquiatra e a essa psicóloga são da instituição?
Leandro Prior – Não, de jeito nenhum. A Polícia Militar do Estado de São Paulo não tem setor de psiquiatria. Não tem psiquiatras. É um negócio medonho e completamente ilegal. Eu levo um atestado de uma psiquiatra do SUS e a PM não aceita. Você é obrigado a revalidar [o atestado] na JS2, que é a chamada Junta de Saúde 2. Você vai lá e eles têm que validar ou invalidar o seu atestado. Isso é para qualquer atestado, só que eu peguei uma médica que tem uma especialidade, tem um cadastro na entidade correspondente de psiquiatria, ela pode exercer psiquiatria. Essa junta de três, quatro médicos da Polícia Militar, nenhum tem especialidade ou residência em psiquiatria. Eu falo isso porque eu pesquisei o CRM, o currículo de cada um, e ficam invalidando um ato de médico psiquiatra. Eu pago do meu bolso porque a PM extinguiu a psiquiatria.
Eu tenho uma psiquiatra que me acompanha há anos e eu entrego um laudo que diz que tenho que me afastar por 15 dias. A PM diz não, ‘não vai pegar 15, vai pegar 5’ a partir de um conjunto de médicos que não têm especialização, não me acompanham e me analisaram por um minuto. Não é só o meu caso, todos os policiais que adoecem, estão com ansiedade, levam o atestado de um consultório particular ou do próprio Estado [SUS], a PM não valida. Ela ou invalida e força a pessoa a trabalhar ou diminui os dias [de afastamento]. É também uma forma de perseguição.
Ponte – Não tem psiquiatra?
Leandro Prior – Psiquiatra não tem. Quando você é atendido por um médico, ele é oficial. Quando você é atendido por um psicólogo, é um praça [categoria mais baixa da PM], sempre um cabo ou soldado, dificilmente é um sargento. Se você está sendo perseguido, humilhado, subjugado pelo seu comandante, você não vai abrir o que está acontecendo para outro militar. Você compreende a dificuldade de se abrir para um companheiro de serviço? Porque ela é uma pessoa fardada. Tem um conselho de classe que não permite que se passe as informações, mas a gente está no militarismo e foda-se o conselho de psicologia. Se o comandante quer um laudo de tal forma, ele vai ter o laudo, porque o psicólogo é um praça que tem que obedecer senão também é punido.
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Ponte – E o que você fazia?
Leandro Prior – Eu tive que levar vários atestados para afastar de ‘picadinho’ [dias fracionados]. Você ter que trocar de atestado é ter que forçar a sua ida para um local que só te dá gatilhos, que vai te deixar mal. Eu lembro todas as vezes em que eu passava mal porque eu era obrigado a trocar o atestado e pisar na merda de uma área militar, passar por um militar que olha para você e te subjuga. Você pega um papel e vai para outra área militar no HPM [Hospital da Polícia Militar] e você não pode falar nada porque os militares que te subjugam são oficiais. Depois você pega o laudo, positivo ou negativo, e vai entregar na sua unidade. Se você está sendo perseguido, tem ansiedade, tem depressão, você não tem forças, o teu corpo dói. Quando eu ia no 13º Batalhão entregar o meu atestado, eu sentia nojo, meu corpo tremia, eu tinha vontade de vomitar. Eles fazem isso para te adoecer mais e não ajudam no processo de recuperação justamente porque não têm esse tato.
Ponte – Você se via sozinho na corporação?
Leandro Prior – Eu não me enxerguei sozinho porque eu sempre tive muito apoio, só que o apoio velado. É aquele apoio de ‘estou com você, não concordo com o que os oficiais estão fazendo, mas não posso me expressar porque se eu me expressar, eu também vou ver perseguido’. Tem esse medo. A Polícia Militar de São Paulo precisa urgentemente ser desmilitarizada para que nós tenhamos seres humanos normais, com identidade, trabalhadores que possam ser sindicalizados e saibam o que é lutar pelos seus direitos e se organizar e não ficar acuado, acovardado, com medo de ser perseguido com o uso inadequado do RDPM [Regulamento Disciplinar da Polícia Militar]. Nunca foi o regulamento disciplinar da corporação, é o ‘RQuero’, é o que eu quero e acabou. Essa é uma máxima desde a época que meu pai trabalhava [na corporação] e eu ouvia quando era pequeno. Os oficiais falseiam que o regulamento é usado de forma discricionária porque o comandante tem essa discricionariedade, sendo que, na verdade, usam de forma arbitrária para perseguir os seus desafetos. Quando você é amigo do comandante, abre um IP [investigação preliminar], que é aquela apuração preliminar, escuta e arquiva. Se você não é amigo, apura-se com o rigor da lei e arbitrariedade.
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Ponte – O que fez você querer entrar para a PM?
Leandro Prior – Eu quis entrar porque meu pai era policial, meu tio era policial, meu avô, então eu acreditava que eu conhecia a Polícia Militar sob os olhos dos meus familiares, tanto que meu aniversário de um ano de idade foi dentro da PM. Sempre tive um carinho imensurável pela PM, mas nunca imaginei do que se tratava de fato porque era um olhar apaixonado de quem admira e respeita enquanto cidadão. Então, eu era apaixonado e admirava a narrativa daquilo que eu acreditava que a PM fosse e não a verdade, que é uma instituição machista, misógina, xenofóbica, racista, homofóbica e transfóbica. Você é um pouco mais aceito, por exemplo, sendo mulher preta e LGBT se você for de direita porque existe uma perseguição em torno das convicções políticas.
Ponte – E como seus parentes que atuaram na corporação reagiram quando você decidiu sair?
Leandro Prior – [alguns segundos de silêncio] Eu não tenho contato com eles, são todos homofóbicos e bolsonaristas, como a instituição. Tenho acolhimento por parte dos que não são bolsonaristas, minha mãe, minha avó, meu padrasto, que é a minha família.
Ponte – Quantas investigações foram abertas contra você?
Leandro Prior – Essa lista parou em 16, mas são 18 peças ativas entre sindicâncias, inquéritos, processos administrativos.
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Ponte – E você teve custo com essas apurações?
Leandro Prior – Sim, tanto que por muito tempo eu tive que morar no quartel, o que é horrível, porque você fica sem ambiente familiar. Só mora em quartel quem tem dificuldades financeiras e eu tinha para poder permanecer na PM. Eu tive um advogado que me deu um ‘balão’ e me levou R$ 15 mil, outro também me levou um dinheiro e só com um terceiro que não fosse picareta eu consegui ir adiante, mas levou parte do meu salário. Esse também é um dos motivos que ninguém quer se indispor com comandante porque ninguém quer ser perseguido, ninguém quer ser mandado embora, ninguém quer ficar pagando e passando por esse tipo de humilhação, ser visto como bandido.
Ponte – E como você está vivendo agora?
Leandro Prior – É difícil porque minha ansiedade voltou, minha depressão voltou, minha vontade de fumar voltou, mas eu estou fazendo acompanhamento com psicóloga e psiquiatra para tentar levar a vida normal, ter tesão pela vida, ter a minha vida de volta porque os oficiais que estavam me comandando conseguiram arrancar o tesão que eu tinha por trabalhar. Eu acordava obrigado, eu me arrastava para ir trabalhar, eu cumprimentava as pessoas obrigatoriamente, eu fazia as coisas me arrastando. Era um peso.
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Isso é paradoxal porque eu estava lutando para permanecer onde eu estava e, enquanto eu estava lá, não me fazia bem. Eu sempre amei o que eu fazia, não de amar a corporação porque eu não sou corporativista, a farda para mim não é sagrada, sagrado para mim é servir a população, proteger a população. É você conseguir salvar alguém, abraçar a pessoa e olhar nos olhos dela e receber um ‘muito obrigado’, como já aconteceu inúmeras vezes. O sagrado está no exercício da função e eu durante três anos lutei contra os mais diversos comandantes e coronéis para permanecer onde eu estava até perceber que onde eu estava é o que estava me matando. Não vale a pena.
Ponte – Quais são seus planos daqui para frente?
Leandro Prior – Eu vou esperar agora para me qualificar mais, ver se uma oportunidade de trabalho, que ainda não posso dizer, dá certo. Falta um ano para eu terminar a faculdade de direito. Por enquanto estou conseguindo me manter porque tenho amigos policiais penais e policiais civis que estão me ajudando financeiramente até que eu seja contratado. Tenho apoio de amigos do movimento Policiais Antifascismo. Assim que abrir um concurso na área do direito, eu pretendo fazer porque meu objetivo final mesmo é magistratura, mas ainda tenho uns anos para me preparar.
A Ponte procurou as assessorias da Secretaria de Segurança Pública e da Polícia Militar a respeito das apurações contra Prior, além das denúncias de ameaças e ataques que sofreu bem como sobre o atendimento psicológico a policiais e aguarda uma resposta.