'Eu confiava na polícia', diz Maria, mãe de Márcio, morto pela PM

    Foi Maria dos Anjos quem chamou a PM para ajudar o filho, que estava transtornado em cima do telhado, em 2012, mas não imaginava que os policiais iriam matá-lo. “Ele falava que queria ser alguém na vida. Não deu tempo”, lamenta

    Ilustração: Junião

    Para marcar os 15 anos dos Crimes de Maio, a Ponte publica 15 perfis de mulheres que perderam familiares para a violência policial, originalmente publicados no livro “Mães em Luta”, organizado por André Caramante e editado por Ponte e Mães de Maio em 2016

    — Não passo um único dia sem lembrar dele. Todo minuto vejo ele. É muito difícil. Às vezes eu vou indo assim na rua e acho alguém parecido, algum detalhe no rosto ou o jeito de andar. Tem um moço na igreja que quando eu vejo do lado de fora fazendo o louvor, é ele louvando. Eu tenho certeza que é.

    Assim Maria dos Anjos Martins dos Santos fala sobre como tem sido a vida depois de 5 de fevereiro de 2012, quando o filho mais velho, Márcio Martins dos Santos, à época com 31 anos, foi morto com um tiro na virilha pela Polícia Militar de São Paulo. Evangélica, ela e Márcio frequentavam a mesma congregação, a Assembleia de Deus, mas iam a templos diferentes, embora os dois estejam localizados na região de Cangaíba, na zona leste da cidade de São Paulo.

    — Ele falava que queria estudar, que queria ser gente, que queria ser alguém na vida. Não deu tempo. Foi impedido. Se ele fosse vivo, teria 35 anos — conta Maria, sentada no último de quatro degraus de uma escadinha de madeira que fica na cozinha, onde também funciona a sala de visitas, e que dá acesso ao quarto onde vive atualmente, num encontro com a reportagem feito em 2016. Moram na casinha modesta de três cômodos localizada na Favela da Caixa D’Água Maria dos Anjos, Viviane, filha mais nova e única irmã de Márcio, e Yasmin, neta de Maria.

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    A favela fica na avenida Cangaíba, em Engenheiro Goulart, a cerca de cinco quadras da casa onde o crime contra o filho aconteceu e de onde Maria quer distância.

    — Não consigo voltar lá. É como ver um filme, sabe?

    Hoje, vivem na casa o ex-marido, Ismael, e o sobrinho, Paulo, que me recebeu na primeira tentativa de encontrar Maria dos Anjos. No portão cinza, na rua Antonio Xavier de Matos, o número 35 amarrado com arame está do lado par da rua, o que confunde bastante quem nunca esteve no local.

    — Se tem um dia que me arrependo na vida foi esse. Eu que tive ideia de ligar para a polícia, mas foi na melhor das intenções. Quem diria que iria acontecer o que aconteceu? — disse Paulo, com disfarçada emoção.

    Ele contou que a tia morava perto dali, mas que era difícil explicar como chegar porque nunca tinha ido ao local e a rua não tinha nome.

    Um dia após a morte de Márcio, Maria mudou-se definitivamente para a casa da filha na comunidade vizinha, a Favela da Caixa D’Água. Seis meses depois, conseguiu entrar de novo na antiga casa, para tirar alguns pertences do filho e levar para a doação, além de fazer uma faxina no local, na esperança de que, segundo ela, a sensação com relação ao lugar mudasse. Não mudou. Natural da pequena Eldorado, de pouco mais de 15 mil habitantes e no interior de São Paulo, Maria vive na capital paulista há mais de quatro décadas e não pensa em voltar para a cidade natal, mesmo lembrando com carinho da infância pacata.

    — Não tenho muito o que contar… era um lugar muito bom de se morar, a cidade é bem bonita e tranquila, todo mundo se conhece. É a cidade da Caverna do Diabo, conhece? — na tentativa de explicar a origem da fama da conhecida estância turística perto do litoral e nem tão longe assim da capital: cerca de 150 quilômetros de distância. Ainda assim, Maria vai apenas uma vez por ano para lá.

    É a mais velha de sete filhos, todos criados apenas pela mãe.

    — Meu pai? Não tenho como dizer, não sei quem é. Ele largou todos nós quando eu já era crescidinha, mas ainda criança. Minha mãe criou todo mundo sozinha. Era trabalhadeira.

    Maria tem mesmo a quem puxar. Aos 12 anos, por indicação de uma conhecida, mudou-se para São Paulo para trabalhar em uma casa de família cuidando de uma criança.

    Chegou a voltar para Eldorado, mas quando completou 21 anos quis retornar à capital paulista, onde trabalhou como empregada doméstica na casa de uma advogada na Pompeia, na zona oeste de São Paulo. Conquistou a confiança e anos mais tarde, quando o filho da antiga patroa casou, foi trabalhar para ele, na região do Ibirapuera, também área nobre, só que dessa vez na zona sul.

    Ele também era um advogado. Ironicamente, anos mais tarde, Maria se veria às voltas com a Justiça, tentando buscar uma reparação, mínima que seja, para tudo que aconteceu e que modificou a vida dela por completo.

    Foi também passadeira em uma confecção de roupas no Bom Retiro, polo têxtil no centro da capital, que faliu no final dos anos 90 e no Mappin, que teve destino semelhante alguns anos antes. Vendeu cachorro-quente na Penha e só parou de trabalhar depois dos problemas de saúde que adquiriu nos últimos quatro anos.

    Com tanto trabalho, nunca estudou.

    — Escrever eu não sei, não. Ler, assim, eu consigo. Não pode ser muito grande e nem palavra muito complicada — rimos.

    Provocada sobre o que gostaria de ser se tivesse tido outras oportunidades na vida, nem piscou:

    — Advogada. Por quê? Para tentar entender e acabar com as injustiças, como a que aconteceu com a gente.

    Econômica nas palavras, mesmo anos após a morte do filho, Maria ainda chora muito ao falar de Márcio, ao lembrar daquele fevereiro de 2012, quando ele foi atingido pelo tiro disparado pela PM — chamada para ajudar no seu resgate —, caiu do telhado e morreu provavelmente a caminho do hospital.

    Maria não foi autorizada a acompanhar o filho até o Hospital Ermelino Matarazzo, também na zona leste.

    — Jogaram ele como se fosse um lixo na viatura.

    Para trás ficaram o chão da casa tingido de sangue, que, segundo um dos policiais, era do nariz quebrado de Márcio ao cair de cara no chão, e o varal cortado com uma faca de cozinha, que no boletim de ocorrência registrado no 24º DP (Ermelino Matarazzo) pela PM aparecia nas mãos da vítima.

    — Eles fizeram aquele exame das digitais, sabe qual é? Ele não tinha passagem pela polícia — ressaltou com comedida exaltação, embora isso sirva mais para satisfação pessoal dela.

    Soa mais como algo que se aproxima de uma mãe que se orgulha de um filho que foi correto durante a vida — no aspecto legal — do que qualquer tentativa de tornar mais ou menos grave o assassinato do filho pelo braço armado do Estado.

    Viviane, que acompanhava a conversa, em muitos momentos ajudava a mãe a lembrar dos fatos ou mesmo completava frases. Foi ela inclusive que lembrou que havia dado ao policial a faca para que cortasse o varal que poderia atrapalhar o resgate do irmão.

    — Eu mesma entreguei ao policial a faca e depois levei de volta até a cozinha. Tem tanta mentira nessa história… Acho que resume bem eu dizer que quando chegamos na delegacia o B.O. estava pronto. Como é que pode uma coisa dessa? Quiseram colocar a faca na mão do meu irmão no B.O — diz a sacudida e indignada Viviane. Maria consente.

    As duas são, aliás, contrapontos e, talvez até por isso, tenham encontrado o equilíbrio para seguir em frente juntas e contar essa história.

    — Estou falando disso pela primeira vez. A maioria das pessoas não sabe o que eu passei, o que eu passo — me confidencia Maria.

    Quando perguntei o que diria ao Marcio hoje, caso tivesse oportunidade, um silêncio. E na sequência um choro tímido e tão dolorido.

    — Com licença — ela diz e abre a cortina branca com um delicado bordado de flores também brancas que separa a cozinha e o quarto.

    Volta com um rolo de papel higiênico. Delicadamente tira dois pedaços: um para os olhos e outro para assoar o nariz. Peço um pedaço também. E agradeço. O silêncio se rompe apenas para, entre novas lágrimas, dizer:

    — Não deu tempo de eu falar nada. Ele foi arrancado de mim.

    Atualmente dona de casa, Maria é econômica nas palavras e nos gestos. Não se pode dizer que seja tímida, mas certamente reservada. Até por isso, não quis dar muitos detalhes da vida amorosa antes de casar-se com Ismael — para ela ex-marido, embora ainda casados no papel — pai dos seus únicos dois filhos, Márcio e Viviane. Ele ainda chama Maria dos Anjos de esposa.

    — Ele era apaixonado por ela. Quer dizer, ainda é — confidencia a filha, deixando a mãe com as bochechas rosadas.

    — Eu não queria casar, mas aí quando ele percebeu que o namoro estava esfriando e que talvez eu desistisse dele, pediu minha mão. Ele ameaçou se jogar do prédio lá onde funcionava o sindicato (da construção civil), perto da Sé, se eu não me casasse com ele. Acredita? — lembra Maria com os olhos arregalados, mas com uma pequena dose de chiste — Já tá bom desse assunto, né? — encerra, explicando que teve outros namorados, mas marido só um mesmo.

    Talvez por certa desconfiança, manteve-se na mesma escada de madeira, apenas intercalando entre o segundo e o quarto degraus, porque nos últimos anos ganhou alguns quilos e em outra posição ficava um pouco desconfortável. As mãos de unhas curtas e sem esmalte repousavam no colo.

    O encontro com Maria dos Anjos, antes que ela me convidasse para entrar em sua casa, aconteceu na viela a 80 metros da porta de entrada de onde ela há quatro anos chama de lar. A Favela da Caixa D’Água é, aliás, toda de vielas bem estreitas e bastante íngremes. Uma das moradoras resume a topografia dizendo:

    — O Samu não desce aqui, não. Só a polícia, quando tem baile funk.

    Maria dos Anjos descia com a neta Yasmin do ponto de ônibus da avenida Cangaíba e, embora nunca tivesse me visto na vida, recebeu-me com um sorriso simpático e receptivo. Discreta, usava um vestido preto alguns dedos para baixo dos joelhos, modelo bastante difundido entre as mulheres evangélicas, e um “bolerinho” de renda, preto e preso com um broche bem delicado. Os cabelos, assim como a roupa, pretos, estavam presos no que no interior de São Paulo chamariam de “birote”. É difícil encontrar fios brancos.

    Com a mão direita, segurava a neta e com o braço esquerdo carregava uma boneca de pano, que depois saberia é a terapia que tem feito diminuir a dor da sau dade. Desde a partida do filho tem frequentado o grupo da terceira idade da igreja e feito bonecas de pano. Com olhar cansado, estende a mão direita:

    — Eu estava no Hospital São Paulo, onde faço tratamento. Perdi a visão do olho direito depois da morte do meu filho.

    Não foi apenas essa a marca física da saudade. Ganhou peso, desenvolveu diabetes e pressão alta.

    — Não sei exatamente o que foi no meu olho, nem os médicos sabem. O que me disseram é que tive um pico de pressão por causa do trauma.

    Ela contou que, desde o dia do velório, que aconteceu quatro dias depois da morte e com caixão fechado, o olho direito estava bem avermelhado, mas parecia irritação dada a quantidade de lágrimas derramadas.

    A demora para enterrar o filho se deu porque havia muitas divergências entre o boletim de ocorrência registrado pelos policiais militares Cristiane Francisca Leonardi dos Santos e Sidnei Alves de Oliveira e o laudo da perícia que indicava que Márcio havia morrido em decorrência de uma hemorragia causada por objeto perfurante condizente com disparo por arma de fogo. Maria define como indignação a sucessão dos fatos e as mentiras contadas pelos membros da Polícia Militar.

    — Acho que nunca vou entender porque contaram tanta mentira.

    Maria diz que a visão que tem da PM mudou completamente.

    — Acho que a melhor palavra para isso é decepção. Eu confiava na polícia. O Ismael (ex-marido) tem umas doenças da cabeça, sabe? Toma remédio controlado desde que o conheço, mas tem uns surtos às vezes. E eu sempre chamava a polícia, porque o bombeiro dizia que não podia fazer intervenção sem a presença da viatura. Eu só conseguia levar ele pro hospital desmaiado. Quem eu chamava e que sempre me ajudou? A polícia. Era realmente uma proteção. Quantas vezes entrava a polícia em casa, tinha a maior paciência com ele e conduzia para o hospital. Hoje eu perdi a confiança.

    O que ficou registrado nos autos do processo, no boletim de ocorrência, nos depoimentos à Defensoria Pública, na perícia e a história de 5 de fevereiro de 2012 guarda algumas divergências.

    Maria disse se lembrar da data como se fosse hoje, mas lamenta não ter detalhes do passo a passo do filho e dos policiais que foram atender ao chamado, muito em virtude do nervosismo. Outro elemento que pesou contra foi o horário da ocorrência: um pouco depois das 23h de um sábado.

    — A iluminação do lado de fora da casa era ruim. O telhado estava escuro — explicou Maria, que não estava em casa no momento em que Márcio subiu no telhado.

    Yasmin, filha de Viviane, tinha nascido há poucas semanas e ela estava tentando dar o peito à criança.

    — Eu estava tendo dificuldades para amamentar, depois desse dia meu leite secou de vez — conta Viviane.

    As duas foram chamadas por vizinhos para ir até a casa, onde, segundo Maria, Márcio teria discutido com o pai, Ismael, paciente psiquiátrico a vida toda e medicado com remédios controlados. Repetição.

    Diferente do que foi divulgado por reportagens da época, Maria nega que o filho tivesse algum distúrbio pregresso, mas evitou entrar em detalhes do contexto e motivo da discussão.

    — Meu filho era normal. Acho que só tomava remédio para dor de estômago, que tinha de vez em quando.

    Para ela, a única pessoa capaz de dizer exatamente o quê, como e por que tudo aconteceu não ficou para contar a história: a vítima Márcio Martins dos Santos.

    De fato, a forma como a mãe fala do filho não condiz com a de alguém doente. Maria pede licença e vai até a gaveta da cômoda pegar um álbum de fotos, bastante puído. Ao abrir, imagens de Márcio sempre muito bem vestido, ao lado de amigos, em festas e participando de cultos na Assembleia de Deus.

    — Ele gostava de se arrumar, era vaidoso.

    Ela conta que, no dia seguinte a morte, o filho deveria ir a um congresso de jovens para representar a igreja que frequentava e que muita gente ligou querendo saber por que ele não havia aparecido.

    — Ele sempre vinha com alguma brincadeira, ria por nada, as crianças gostavam muito dele. Uma das coisas que gostava de fazer era cozinhar — conta mostrando com orgulho as imagens de um filho que nas fotografias passava a imagem de um jovem simpático, bem quisto, enfim, um rapaz de 30 e poucos anos e muitos sonhos.

    Segundo Maria, Márcio não gostava de gordura, preferia cozinhar aquela comidinha básica do dia a dia: arroz, feijão e bife. “Grelhado, tipo que nem churrasco”, pontua. Mas o elo dos dois com a comida não parava por aí. Com um disfarçado sorriso quase infantil, Maria lembra que, vez ou outra, Márcio dizia: “Ô, Dona Maria, leva uma comida boa pra mim no serviço hoje?”. Quase sempre quando era dia de feijoada na casa de uma amiga da Favela da Caixa D’Água. Ela prontamente fazia uma marmitinha e levava para o filho, que trabalhava como segurança em uma área comercial na Penha.

    Ao explicar que a chegada de Márcio para ela e Ismael era muito esperada, definiu o filho como um projeto,

    — Acabaram com aquela ilusão que a gente tinha. Acabaram com aquele projeto. Eu não entendo por que fizeram isso com ele… A pessoa que fez isso com ele não tinha raiva dele, tinha raiva de mim — lamenta.

    Ela conta que ficou quase cinco anos tentando engravidar de Márcio, chegando ao ponto de ir ao médico com o marido para checar se havia algum problema de infertilidade, o que não se confirmou. “Aí, logo depois eu engravidei. Era um projeto, sim”.

    Além do flagrante erro da polícia e incoerências do caso, há uma ironia muito grande que faz o cruzamento da biografia de duas mulheres assumir contornos ainda mais trágicos: Cristiane Francisca Leonardi dos Santos, a PM que apertou o gatilho e disparou o único e certeiro tiro que vitimou o filho de Maria, também é mãe.

    — Lá na delegacia, eu estava sentada em uma cadeira com meu ex-marido do lado. Ela passou por mim e, sabe, eu acho que ela queria dizer alguma coisa. Eu senti isso — mas Cristiane, esposa de um policial e hoje nos registros oficiais constando como “do lar”, nada disse.

    Bastante religiosa, quando o assunto foi o perdão, pesou mais o zodíaco e a dor da perda do que qualquer outra coisa:

    — A senhora perdoou a Cristiane?

    — De coração? Só Deus. Só Deus pode perdoar. Quem sou eu, né? — disse a canceriana, que põe até mesmo em dúvida se foi mesmo Cristiane quem atirou.

    Além das frequentes visitas ao hospital, Maria perdeu as contas de quantas vezes foi até o Fórum Criminal da Barra Funda. Em 2 de abril de 2016, a Justiça deu ganho de causa à família de Márcio e condenou o Estado a pagar R$ 100 mil. Mas o governo de São Paulo recorreu.

    — Nós não recebemos nada e não há previsão. Não recebi nenhum real. Nada. Não vai trazer a vida dele de volta, mas já que aconteceu, eu quero centavo por centavo — diz Maria.

    Falar da igreja é das poucas fontes de alegria de Maria. Ao recordar um dos últimos momentos com o filho, os olhos brilharam:

    — Foi algumas semanas antes do ocorrido. Tínhamos ido a um casamento e depois íamos para uma vigília que aconteceria de madrugada em uma igreja aqui perto. Eu estava feliz. Foi um dia feliz.

    Apoiada na fé em Deus e na presença da neta que cuida como se fosse uma filha, Maria tem levado os dias e tentado, sem muito sucesso, superar o vazio que deixa a saudade de quem nunca mais vai voltar e dizer: “Dona Maria!”.

    — Tem dia que dá uma tristeza tão grande, tão grande. E olha, eu só não pego uma estrada só de ida, porque eu tenho minha neta. Porque senão eu já tinha ido embora — diz Maria, em tom soturno e com certa dose de resignação. Em um silêncio quase cúmplice, pego nas mãos dela. “Você não quer ficar para jantar?”. Nos despedimos e ela deseja que eu fique com Deus. Fique com ele também, Dona Maria.

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